Contos: Volume 2 é o segundo livro do autor H. P. Lovecraft lançado pela editora Martin Claret em 2018.

SOBRE O LIVRO

Novamente trazendo contos inéditos e pouco conhecidos do autor, este livro reúne nove histórias que compõem o chamado Ciclo dos Sonhos. Esses contos, diferentemente dos publicados no primeiro volume, tratam mais de fantasias psíquicas, alucinações e portais dimensionais do que histórias pautadas no horror e medo. Entretanto, ainda é possível notar em alguns desses contos o medo humano pelo desconhecido. Compondo uma faceta menos conhecida do autor, as histórias tem forte inspiração nos contos do Lorde Dunsany, que fora muito popular nas primeiras décadas do século XX.

Conforme a introdução feita por Daniel L. Dutra nos apresenta, Dunsany foi até mesmo influenciador de outros autores, como Tolkien e Gaiman. Lovecraft, nos seus primeiros escritos, demonstra grande aproximação dos contos de Dunsany, porém, com originalidade própria. O próprio Lorde afirma que as histórias de Lovecraft se aproximam das dele apenas no modo de escrita, mas tem vida independente no que se refere à mensagem.  O Ciclo dos Sonhos também foi uma porta de entrada para o lado mais obscuro do autor, e nesses contos já é possível notar sua admiração pelo cósmico, divino e estranho ao ser humano.

“Possam os misericordiosos deuses, se verdadeiramente existem, proteger-me nessas horas, pois nem o poder da vontade nem as drogas que a astúcia humana inventa podem guardar-me do abismo do sonho.”

Dentre os contos que trabalham com dimensões acessadas através dos sonhos, temos o conto de abertura, Celephaïs, onde o jovem Kuranes procura com avidez a lendária cidade de Celephaïs, mesmo que sua busca se estenda por anos a fio. Também no conto A Chave de Prata, temos uma busca incessante pela chave do portal, que se encontrada, abriria as portas para um local, seja cidade ou dimensão, aparentemente desconhecida.  Já alguns contos fogem um pouco dessa temática, mas ainda assim brincam com a nossa imaginação. É o exemplo de A maldição que atingiu Sarnath e Os Outros Deuses. Neste dois, principalmente, o lado do temor ao desconhecido se mostra mais presente e possivelmente demonstram onde o autor começou a criar o seu universo cósmico de horror. Seja qual for o conto deste livro, cada um tem uma mensagem interessante a passar e que vale a pena conhecer.


MINHA OPINIÃO

Por muito tempo ouvir falar de Lovecraft e sua importância para o horror moderno, mas meu primeiro contato com ele se deu ao ler o conto Os Outros Deuses. Desde então eu fiquei mais e mais interessado em conhecer as histórias do autor e decidi então iniciar minha jornada com o primeiro volume de contos lançado pela Martin Claret (resenha aqui). Seguindo minha odisseia, li este segundo volume de contos onde tive a oportunidade de conhecer outra versão do autor. Não foram todos os contos que me prenderam tanto, mas uma pequena parcela deles de fato me envolveu bastante. Diferente do primeiro volume, aqui temos contos bem curtos. O menor tem cerca de cinco páginas; o mais longo, vinte e duas páginas.

Assim como na edição anterior, esta está impecável. Temos o uso de cores mais gritantes e menos sombrias (laranja e verde) e com ilustrações que representam as principais passagens das histórias. Na capa temos, ao que suponho, uma representação do último conto, A estranha casa alta na névoa. Na capa de trás, também há representação de pelo mais três contos. Internamente, há olhos desenhados nas folhas de rostos e nas páginas finais, sendo esta a representação de um clássico ser cósmico das histórias do autor. Não menos importante, também é em capa dura e só esse fato já deixa o livro mais belo.

“O gato é misterioso e muito próximo das coisas incomuns que os homens não podem ver. Ele é a alma do Egito antigo e portador de histórias das cidades esquecidas de Meroë e Ophir.”

Estes contos foram escritos enter 1919 e 1921 e é interessante notar que mesmo tendo quase 100 anos, as histórias tem uma linguagem suave e condizente com a atualidade. Deixando o medo de lado, o autor se preocupou em explorar os “E se”, tão comum, principalmente, na ficção científica. E se fosse possível acessar outros mundos enquanto dormimos? E se existir outra cidade, outro lugar, o qual pertençamos de verdade? E se o mundo que julgamos ser real, for na verdade, uma mera ilusão? Não é difícil lermos as histórias e ficar imaginando se, de fato, esses “e se” que o autor nos joga fossem reais.

O interessante das histórias é que, se colocando no lugar dos personagens, não dá pra ter certeza se o que eles vivenciam é ilusão, alucinação ou puramente fantasias reprimidas. Não há como dizer se estão mesmo em uma realidade ou se tudo não passa dentro de suas próprias cabeças. Inclusive, um dos contos, Hipnos, até lida com essa questão. O final induz o leitor a questionar a real natureza dos acontecimentos ali narrados.

Essa sensação se estende em quase todas as histórias, mas as que mais me cativaram foram: Os Outros Deuses, Os Gatos de Ulthar e A maldição que atingiu Sarnath. Neste último, temos uma narrativa um tanto quanto profética. Nele, os humanos tomam para si a cidade sagrada de Sarnath e ali profanam os antigos monumentos e objetos dedicados aos antigos deuses. Em cima da cidade, por milhares de anos, a civilização vive em festa, comemorações e exaltando-se como a superior. Porém, não sabiam com quais forças ocultas estavam lidando, quem eram os antigos deuses que ali foram adorados e quais eram suas verdadeiras “intenções”, digamos assim. É uma trama interessante, pois questiona a violência e imoralidade humana, nos critica por sermos arrogantes e credores de uma fantasia ancestral de superioridade.

“E acima das névoas de Hatheg-Kla os deuses da Terra dançam as memórias dos tempos passados; pois sabem que estão protegidos e gostam de vir da desconhecida Kadath nas naves de nuvem e de dançar como nos velhos tempos, do modo como faziam quando a Terra era jovem e os homens não escalavam regiões inacessíveis.”

Já os Gatos de Ultar, temos um conto com cunho moral. Na cidade de Ultar há uma regra de que ninguém pode matar gatos. Todos obedecem e por isso a cidade possui muito desses animais. Mas um casal não gosta dessa lei e com raiva dos felinos, decidem desobedecer a lei. Mas ao fazerem isso, consequências graves ocorrem ao casal. Achei bacana o autor usar da mística egípcia que envolve gatos (como seres sagrados, com conexões com deuses, etc) para ao mesmo tempo nos criticar à matança de animais, tema esse hoje tão discutido em nossa sociedade.

Do conto Os Outros Deuses, por já possuir resenha aqui, apenas farei um adendo de que foi muito gratificante relembrar essa história que me apresentou o autor. A jornada do personagem Barzai é bonita, a vontade do ser humano em resgatar antigos elos que se quebraram, mas que também demonstram a nossa fraqueza e inexperiência diante da grandeza dos mistérios do universo, a nossa irrelevância dentro de um cenário maior.

Eu gostei dos contos apresentados e acredito que ainda há muitas histórias incríveis para a Martin Claret trazer em um volume 3, tanto para os novos fãs do autor, como também os já mais veteranos. Não há dúvida que este livro seja um belo presente para os fãs veteranos, bem como para os novos fãs – assim como eu – que estão descobrindo quão interessante é o mundo de mistério e surrealidade que o autor cria em suas histórias.

4estrelasb

CONTOS VOL. 2 – H.P. LOVECRAFT

Autor:H.P. Lovecraft

Tradutor:Vários Tradutores

Editora:Martin Claret

Ano de publicação:2018

Nesta edição, volume II da coleção, reunimos alguns dos contos mais famosos de H. P. Lovecraft, que figuram o chamado “Ciclo dos sonhos”. O volume contém “Celephaïs”; “A busca de Iranon”; “A nau branca”; “A maldição que atingiu Sarnath”; “Os gatos de Ulthar”; “Os outros deuses”; “Hipnos”; “A chave de prata” e “A estranha casa alta na névoa”. Mais uma leitura imperdível para os amantes do horror.

Relacionados

Destaques

Insta
gram

[jr_instagram id='3']

Parceiros