A Experiência Nacional: identidades e conceitos de nação na África, Ásia, Europa e nas Américas é um lançamento da editora Civilização Brasileira organizado por Flávio Lomoncic e Francisco Carlos Palomanes Martinho.

Sobre o Livro

Começo essa resenha com uma pergunta de simples resposta: o Brasil é uma nação? A resposta “sim” nos vem na ponta da língua, certo? Mas compliquemos um pouco agora: a Palestina é uma nação? Ora, agora a pergunta está mais difícil! Como a Palestina pode ser uma nação se não tem território? E o Canadá, como pode ser uma nação, se parte da população fala inglês e parte da população fala francês? E no caso espanhol, em que a parte norte do território nem mesmo se identifica como espanhola?

Essas e muitas outras perguntas são feitas por cientistas sociais, geógrafos, filósofos e historiadores. No caso da minha área de formação – a história – a preocupação é a seguinte: de que maneira os Estados ao redor do mundo começaram a se configurar em torno de Estados-Nação a partir do século XIX? E, mais importante: o que qualifica ser uma Nação desde então? Seria o território? Mas estaríamos, então, excluindo exemplos de Nação como a Palestina. Seria a língua comum? Estaríamos, então, excluindo países como a Espanha e o Canadá. É uma questão complexa, não é?

“Enquanto estas páginas foram escritas, homens, mulheres e crianças continuaram, e continuam, a matar e a morrer por suas nações. Com tal livro, esperamos contribuir para (…) uma das tarefas fundamentais do historiador do início do século XXI, qual seja, a de desmistificar as ideologias nacionalistas, entendo as nações não como dados, mas como construções; não como essências genéticas, biológicas ou espirituais, mas como fenômenos históricos.”

E vejam o quanto a nacionalidade ainda é presente: por que os militares de guerra americanos são considerados “heróis da nação”? Eles contribuíram para o bem-estar de todos os cidadãos norte-americanos? Não, mas o sentimento de nacionalidade é tão forte que pode levar até à guerra entre uma população e outra, fazendo com que os assassinos envolvidos sejam vistos como heróis. Em A Experiência Nacional, os autores têm o objetivo de discutir como esses fenômenos chamados “Nação” surgiram ao redor do globo, assim como refletir sobre como estão atualmente as nacionalidades. Pensando em alargar a discussão ao mundo como um todo, Lomoncic e Martinho propõe (re)pensar alguns aspectos da discussão sobre as nacionalidades.


Minha opinião

Quando tratamos de um livro acadêmico ou de um livro histórico, algumas considerações devem ser feitas. Não podemos começar a falar de assuntos complexos – tal como o das nacionalidades – sem explicações prévias, certo? Afinal de contas, ninguém (que não seja formado em história) tem a obrigação de ter lido as obras de Eric Hobsbawm e Benedict Anderson. Com isso em mente, fui surpreendido pela estrutura desse livro: quatro páginas de apresentação – que não explicam quase nada para leigos – e nenhuma conclusão. Isso mesmo, passamos lendo 450 páginas sobre diversas experiências nacionais no mundo e não concluímos nada a partir disso.

Além desse ponto, a obra apresenta outra questão problemática: o eurocentrismo. Dentro das ciências sociais e/ou humanas, nos referimos a “eurocentrismo” quando queremos dizer que algo tem foco excessivo na Europa. No caso da História, isso é muito comum, pois – além do Brasil – dificilmente aprendemos algo além de História da Europa na escola. O ensino de história no Brasil é, portanto, eurocêntrico, assim como nossa cultura ocidental como um todo. Porém, esse livro tem a proposta de falar sobre as questões nacionais do mundo enquanto um todo, certo? Sim, mas ele não fez isso! Dos 14 capítulos, apenas 4 são fora do círculo Europa-Estados Unidos. Ou seja: continuam sendo eurocêntricos e, portanto, vão contra aquilo que eles mesmo organizaram.

Por outro lado, o livro traz questões interessantes. Em primeiro lugar, eu confesso que – apesar das críticas – aprendi muito com essa obra. Mesmo as questões europeias – que estão tão marcadas nas nossas cabeças – sempre podem ter pontos de vista diversos, e isso foi determinante para me apresentar questões, cenários e narrativas novas sobre as diferentes questões nacionais.

Destaco, especialmente, o capítulo sobre o Brasil e sua relação com a primeira guerra mundial para a construção da nacionalidade brasileira. Gente, que capitolozão da porra! Ele contextualiza brevemente o Brasil frente ao resto do mundo, ao mesmo tempo que explica as mudanças brasileiras e nos enche de questionamentos! É um exemplo de um capítulo – dentre alguns outros desse livro – de tirar o fôlego!

“(…) muito embora novas identidades tenham surgido na arena política – mulheres, negros, homossexuais, ambientalistas, etc. -, muitas delas com forte dimensão transnacional, a nação continua sendo uma categoria e uma experiência vívida central para a compreensão desse início de século XXI, tanto quanto o foi no princípio do XX.”

Ainda assim, novamente precisamos fazer uma crítica: alguns capítulos, como o da experiência angolana, são extremamente confusos. Creio que alguns autores, quando escreviam suas partes, esqueciam que nós não estamos inseridos nos mesmos debates que eles. E, assim, eles colocam expressões, classificações e nomenclaturas desconhecidas para o público geral, sem nem ao menos explica-las! Dessa forma, algumas partes do livro se tornam confusas e difusas, dificultando muito a leitura – especialmente do público leigo.

Por fim, finalizo realçando o lado positivo de um livro que – no geral – teve fortes críticas. Os capítulos bons são muito bons, ao passo que os capítulos ruins são muito ruins. Assim, cabe balancear se valeria a pena para você adquirir o livro para ler as partes primorosas, apesar das confusões. Meu lado historiador aconselharia vocês a lerem, pois todo conhecimento histórico é interessante. Porém, meu lado leitor pensa na questão financeira e, portanto, desencoraja a leitura.

A EXPERIÊNCIA NACIONAL

Autor: Flávio Limoncic e Francisco Carlos Palomanes Martinho

Editora: Civilização Brasileira

Ano de publicação: 2017

A obra que pensa o nacionalismo e suas intrincadas relações com os Estados. O fenômeno nacional é tão presente e generalizado atualmente que muitos o julgam algo natural. Ficamos emocionados ao ouvir o hino do país, o coração bate forte com os gols da seleção e muitos chegam a matar e a morrer em defesa da nação. Este livro, ao analisar tal fenômeno em diferentes países e momentos, procura desnaturalizá-lo, apresentando-o como construção histórica, cultural e política. A experiência nacional reúne 15 historiadores que pensam o nacionalismo e suas intrincadas relações com os Estados, em diferentes momentos ao longo dos séculos XIX e XX em Angola, Portugal; na Alemanha, Argentina, China, Espanha, França, Grécia, Hungria, Itália, Palestina, Rússia; no Brasil, Canadá; e nos Estados Unidos. Os seguintes autores participam da coletânea: Ágnes Judit Szilágyi, Andrea Marzano, Angelo Segrillo, Emiliano Gastón Sánchez, Eugénia Palieraki, Flávio Limoncic, Francisco Carlos Palomanes Martinho, Francisco Sevillano, Goffredo Adinolfi, Leonardo Schiocchet, Lorenz Bichler, Lucia Lippi Oliveira, Luís Edmundo de Souza Moraes, Marcelo Bittencourt, Michel Bock e Olivier Dard.

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