A Maldição de Stalin de Robert Gellately vem trazer à tona algo que muitos de nós deixamos passar somente pelas aulas de história no colegial, e que está muito além do nosso humilde conhecimento sobre a figura de Stalin. O livro foi originalmente publicado em 2013 e trazido ao Brasil pela editora Record em 2017.

SOBRE O LIVRO

Enquanto obra histórica o livro nos traz o conhecimento sobre o projeto de expansão comunista na Segunda Guerra Mundial e seus ecos para além da Guerra Fria. No entanto a narrativa de Gellately apresenta dados e relatos descritos de forma extensivamente abrangente sobre o já conhecido tema, sendo uma forma de aprofundar o conhecimento de curiosos e amantes do período entre guerras.

Tudo tem início mediante os irreparáveis e catastróficos erros do Kremlin, o ataque alemão surpreendeu a União Soviética e quase a empurrou para o abismo da derrota, tendo esta como líder o frio e calculista Josef Stalin que, apesar de não ser o “herdeiro direto” à sucessão de Lenin, uma década mais tarde já era o ditador do socialismo. Ao longo de sua vida e liderança ele chegou a ser a figura a quem se entregavam por inteiro todos os seus “servos”, mesmo aqueles a quem o líder teria acusado injustamente de traição e conspiração durante suas guerras “pessoais”. Stalin era, como denomina o autor: “impaciente pelo comunismo” e diferentemente de Hitler, não buscava reconhecimento ou bajulação.

“Todas as vezes que eles abrem a boca, sai alguma coisa estúpida.”

Era o que pensava o grande líder do Kremlin sobre seus fiéis escudeiros e súditos. Vale deixar expresso que a obra no entanto, não é uma biografia de Stalin, como o próprio autos salienta, mesmo sendo ele o principal “personagem” de todo o terror instaurado no período retratado e por ser o impaciente e impiedoso. Sendo assim, falemos sobre o tema propriamente abordado pela obra.

O conhecido “Grande Terror” não teve início com um simples estalar de dedos de Stalin; este teve três vertentes interligadas, tendo sido a primeira delas dirigida aos inimigos políticos, a segunda erguida contra a oposição social, especialmente dos comerciantes e donos de terras e a terceira sendo a perseguição contra grupos étnicos que na opinião do líder soviético poderiam ameaçar a segurança interna em caso de guerra. Em outras palavras, aqueles que não fossem suficientemente fiéis ao Kremlin, inclusive membros de sua fiel polícia secreta, o NKVD. Em 15 de agosto de 1937 o NKVD expediu, sob orientações expressas de Stalin a “Ordem 00486” que determinava a prisão das esposas de todos os traidores e dos demais condenados pelos tribunais militares.

“Quem tenta destruir a unidade do Estado socialista, quem almeja separar qualquer de suas partes ou nacionalidades dele é um inimigo, inimigo jurado do Estado e do povo da URSS. E exterminaremos cada um e todos esses inimigos, sendo eles bolcheviques ou não. Exterminaremos seus parentes e todas as suas famílias. Impiedosamente exterminaremos quem quer que, por atos ou pensamentos, ameace a unidade do Estado socialista. Brindemos ao extermínio de todos os inimigos, deles e aos de sua laia.”

Stalin julgava que a imposição de seu comando autoritário e a ocupação do Exército Vermelho proporcionava felicidade uma vez que os povos estavam sendo libertados dos domínios dos senhores de terras, dos capitalistas, da polícia e de outros “patifes”.

Em junho de 1941 o avanço alemão parecia ser impossível de conter embora o Exército Vermelho tenha combatido ferozmente os arredores de Moscou até 7 de novembro, o aniversário da Revolução Russa, já conhecido por ser realizada nesse dia, uma parada anual. Em 7 de julho do mesmo ano, foi expedida uma ordem com expressas orientações definindo o modo operante com o qual os aliados estrangeiros ocupados pela Alemanha se unissem na declarada guerra contra Hitler. No período de 28 de novembro a 1º de dezembro de 1943 em Teerã os três grandes aliados: Stalin, Churchill e Roosevelt se reuniram afim de estreitar suas relações de parceria e se prepararem para a maior batalha do século.

Em meio as discussões e organizações ocorreram momentos de impasses, indecisões e divergências entre os líderes, mas o destino final de sua trama para a tão sonhada derrota do inimigo em comum não estaria tão longe. Em 9 de maio de 1945, precisamente às 12h43 a Alemanha assinou o acordo de rendição, sendo este considerado o “V Day” ou “dia da vitória” celebrado na União Soviética. É importante ressaltar, entretanto, que uma guerra como esta não se finda sem deixar marcas e erros irreparáveis. Embora Stalin nunca tenha admitido a guerra deixou rombos e derramamento de sangue incalculável na URSS e em meio ao caos, seu acordo com Roosevelt de prestar apoio aos Estados Unidos na guerra contra o Japão era o último compromisso que o líder desejava honrar. Porém, curioso pelos armamentos bélicos e provido de espiões, Stalin planejava começar sua própria guerra contra o país, e embora tenha durado somente dez dias, está entre as mais importantes guerras da história.

Após a devastação que a guerra trouxe a união soviética, novos planos e ordens foram expedidos para reafirmar o ideal comunista na União Soviética, tendo sido um dos maiores e mais imperdoáveis métodos a chamada “limpeza étnica”. Muito embora esta tenha sido escondida veementemente não só por Stalin, como por seus sucessores durante muitos anos, a remoção da minoria alemã assim como de judeus socialistas foi devastadora.

As ditaduras comunistas se desenvolveram mediante dois estágios na Europa Oriental, sendo o primeiro iniciado nos dois últimos anos da guerra, até 1946-47, onde Stalin criou governos de “frente nacional”, e no segundo momento, o momento das “repúblicas populares” que apesar de terem título democrático, eram caracterizadas por ditaduras comunistas onde um único partido comandava a mando de Moscou.

O curso do comunismo seguiu próspero apesar de algumas lutas perdidas até a morte de Stalin em 5 de março de 1953 às 21h50, a qual alguns historiadores atribuem ao declínio do comunismo, uma vez que carentes da força de vontade ideológica e do punho de ferro de Stalin, este estaria fadado a desaparecer.


MINHA OPINIÃO

Um fato que conta um certo peso à obra é o de que o autor é professor de uma renomada universidade na Flórida e especialista na Alemanha Nazista, também conhecido por alguns outros títulos com esse tema, como sua obra “Apoiando Hitler”. De certa forma, acredito que por ser professor foi relativamente fácil para o autor tratar de um tema histórico com uma linguagem de fácil compreensão. Outro ponto interessante é a existência de um glossário no início da obra ressaltando nomenclaturas importantes e suas definições, além de uma extensa fonte de notas e referências ao final.

Talvez o ponto mais característico da obra seja o fato de o autor carregar a narrativa com impressões e opiniões pessoais, não só a respeito de Stalin, bem como quanto ao desenvolvimento de todos os fatos que instauraram terror ao período narrado, algo que se faz perceptível todas as vezes que o autor o menciona.

O próprio termo “maldição” ao qual o autor atribui ao período de liderança de Stalin faz referência aos atos e atitudes do líder para “pregar” e convencer toda uma nação sobre o idealismo socialista, assim como melhorar a economia do país sem a dependência cega do capitalismo, e a necessidade de expurgar todos aqueles que ameaçassem esse ideal.

O livro é dividido em três partes sendo que a primeira retrata sobre o gancho para a Segunda Guerra Mundial e sua relação direta com a União Soviética, a segunda tratando sobre vários fatos e relatos referentes ao período pós guerra, as alianças formadas e suas consequências, bem como as medidas para a recuperação da URSS; e, a terceira se dedica a descrever o que ocasionou e o desenvolvimento da Guerra Fria contando detalhadamente sobre a atuação da União Soviética e a imposição do socialismo em vários países.

Parte arriscada da narrativa, de certa forma, é o fato de o autor atribuir certa responsabilidade aos Estados Unidos quanto ao decorrer das diversas guerras narradas sendo ocasionadas em parte, pela “inércia” e falta de atitude do presidente Roosevelt, o que é “inovador”, diferentemente dos pontos de vista com os quais estamos acostumados a encontrar nos livros de história e textos que tratam do mesmo assunto. Por um lado, essa parece ser uma interpretação interessante, apesar de poder ser influência da opinião pessoal do autor quanto aos fatos que descreve. Apesar de talvez ser incômodo para alguns leitores não me fez ter grandes questionamentos, afinal, é o ponto de vista de quem “narra” a história, e como toda boa história, sugere que a cada um que se conte nasçam novos pontos de vista, podendo ser conflitantes ou apenas venham para agregar e propor novos olhares quanto a um tema.

Sempre gostei de histórias.. no colégio era minha matéria preferida.. De certo ângulo pode parecer algo “despropositado” para alguns entender fatos que já se passaram há tanto tempo, por outro, podemos reviver aquilo que não tivemos a oportunidade de conhecer (feliz ou infelizmente). Acredito que cada guerra, cada fato narrado nesse livro contribuiu para estarmos aqui hoje e vivermos da forma que vivemos. Sendo assim, a obra só fez aumentar o meu gosto e interesse por fatos do “passado”. Como disse anteriormente, o fato de autor ser um professor contribui para que sua escrita fosse de fácil compreensão apesar de tantos termos históricos. É importante, no entanto, que se esteja atento a cada linha para que nada passe batido, uma vez que cada vírgula, assim como na história, tem sua importância, principalmente por nos levar através dos anos e nos colocar como um espectador a alguns metros de distância de tudo que é descrito. Apesar de tratar de um tema tão importante, acredito que o objetivo do livro não é em si, ser um objeto de estudo mas sim um complemento ou até mesmo o início para quem se interesse pelo assunto.

É uma leitura no mínimo interessante, apesar de extensa, para todos os leitores que se interessem por livros de não ficção e temas como este. Um aprofundamento de visão na figura marcante de um líder político conflitante e que marcou a história.

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A MALDIÇÃO DE STALIN

Autor: Robert Gellately

Editora: Editora Record

Ano de publicação: 2017

As origens da influência internacional de um dos ditadores mais temidos do mundo. Nos anos 1930, já tendo se tornado em tudo um ditador, Stalin empregava o terror como método de governo, justificando-o como maneira de preservar a revolução dos ataques de seus inimigos internos e externos. Ao mesmo tempo, fomentava um culto à liderança que o transformou em uma espécie de deus, a inspirar ativistas e simpatizantes ao redor do mundo. Com base em numerosos documentos originais russos e outras fontes do Leste Europeu, liberados após o fim da União Soviética, além de muitos outros documentos alemães, americanos e ingleses, o historiador best-seller Robert Gellately delineia as origens da crescente influência internacional do tirano, que se inicia nos primeiros dias da Segunda Guerra Mundial e permanece mesmo após sua morte, em 1953. O autor ainda examina o papel central desempenhado por Stalin – com consciência estratégica – no trabalho de implementar o comunismo na Europa e em todo o mundo, de maneira que, ainda hoje, muitos milhões de pessoas aguentam nos ombros seu legado – ou sua maldição.

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