A Máquina do Tempo é um livro de ficção científica clássica do autor H. G. Wells, e foi relançado em 2018 pela Suma.

SOBRE O LIVRO

Durante um jantar entre amigos, um cientista conta aos amigos sobre seu ambicioso projeto: construir uma Máquina do Tempo. Para os demais, tal ideia seria maluquice e viajar no tempo seria improvável. Mas o cientista, crente da realdade física da viagem, se dispõem a provar sua teoria e, dias depois,  narra uma suposta viagem que teria feito a bordo de sua máquina.

“Meu caro, é justamente aí que o senhor se engana. É justamente aí que o mundo todo se engana. Estamos em constante distanciamento do momento presente.”

O cientista conta que fora levado ao futuro, mais precisamente no ano de 802.701, uma era onde a guerra e a fome foram vencidas, a e a humanidade vive em perfeita harmonia. Tudo é motivo para alegria e as pessoas não parecem se preocupar com nada. Mas conforme o cientista passava o tempo nesse novo mundo, começa a descobrir que essa perfeição toda esconde um triste alerta à humanidade.

Desvendando o tecido da realidade daquela época, o viajante do tempo descobre que a civilização se dividiu em dois grupos distintos de pessoas: os Elois, simpáticos humanos de baixa estatura, e os assombrosos Morlocks, com feições monstruosas e de aspecto selvagem. Enquanto busca desesperadamente encontrar sua Máquina e retornar ao seu tempo, o viajante também se descobrirá um profundo – e repulsivo – segredo sobre a organização dessa sociedade.


MINHA OPINIÃO

Escrito em 1895, A Máquina do Tempo de H.G. Wells é até hoje um dos principais livros de ficção científica. Não apenas por criar um subgênero novo, mas também por sua ambiciosa, instigante e alarmante narrativa sobre um futuro não muito promissor à humanidade. O mais interessante é ressaltar que fora escrito na época em que modelos ideológicos como o Comunismo ameaçavam a estabilidade política das nações europeias e, a exemplo de outros livros, a narrativa acabou servindo como uma forma de expor os medos e anseios que o autor tinha em relação aos rumos que mundo tomava.

A narrativa de Wells é bem rebuscada de começo, mas vai se tornando mais fluida e interessante conforme as páginas vão passando. Acredito que, se fosse publicado nos dias atuais, não chamaria tanto a atenção (o próprio autor comentou, em anotações posteriores à publicação, que achou que seu livro poderia ter sido melhor escrito). Mesmo assim, frente ao contexto em que fora publicado, acabou se tornando cult e lembrado ao passar dos anos como uma importante obra de estudo e reflexão. Na verdade, o autor brinca com os gêneros e mescla-os de uma forma bem interessante. Há momentos em que parece distopia, em outras suspense, fantasia, etc.

“Não há diferença nenhuma entre o Tempo e qualquer uma das outras três dimensões espaciais, exceto que nossa consciência se move ao longo dele.”

Não há nomes para os personagens. Eles são designados apenas com suas respectivas funções: o jornalista, o médico, o vendedor e o Viajante do Tempo, o nosso protagonista. A narrativa é feita em primeira pessoa, mas por um dos convidados do Viajante, e não por ele mesmo. Esse convidado, o qual também não há identificação, relata toda a história com incrível fascínio e ao mesmo tempo descrença. Afinal, quem imaginaria que seria possível viajar no tempo em meados do século XIX?

O mais interessante da trama, claro, é a descrição do mundo futuro. Um lugar onde a sociedade aparentemente vive uma utopia, o mundo dos sonhos. Sem guerras, se desigualdade social, sem doenças. Tudo é lindo e maravilhoso. Mas logo o cientista percebe que toda utopia apresenta falhas. Um mundo perfeito assim não teria como existir ou funcionar. Onde estavam as máquinas? Quem provia os alimentos? Quem fabricava as roupas? Não demora muito para o viajante entender o que acontecia naquele mundo. Os Elóis (o povo da superfície) não eram os únicos humanos naquele futuro. Havia outros, subjugados, esquecidos e temidos. Os Morlocks eram o contra-peso e mantenedores do sistema. Mas como e porque isso acabou dessa forma? Nesse ponto o autor começa a sua hábil tarefa de correlacionar a sua narrativa com a sua realidade, e a criticar de forma discreta os modelos ideológicos do seu tempo.

“O mundo inteiro será inteligente, educado e cooperativo; as coisas se moverão cada vez mais depressa em direção ao domínio da natureza. Por fim, com sabedoria e cuidado, reajustaremos o equilíbrio da vida animal e vegetal para se adequar às necessidades humanas.”

Interessante acompanhar a visão e pensamento do autor, pois é possível traçar um paralelo entre os seus personagens e a sociedade em que ele vivia em 1895. Por exemplo, os Elóis tinham descrições que correspondiam aos burgueses ingleses, detentores da boa vida e dominadora dos meios de produção, enquanto os Morlocks podem ser comparados ao proletariado, que era subjugado e forçado a trabalhar em péssimas condições. É uma crítica ao sistema capitalista vigente da época, que de fato não oferecia nenhuma condição razoável de trabalho, nem mesmo nenhum direito ao trabalhador. Não importava se era criança ou mulher, todos eram “qualificados” para trabalhar e servir aos seus senhores, enquanto estes desfrutavam de uma vida calma e plena.

Outra questão política que está evidente na obra são os paralelos ao comunismo. Para o autor, sob os olhos do cientista, os Elóis também evidenciavam uma sociedade regida por um sistema comunista, pois todos se vestiam iguais, não possuíam propriedade privada e tudo era compartilhado entre eles. Não possuíam classes sociais entre os Elóis, não havia governo e todos tinham acesso a tudo. Ao mesmo tempo que para sua estabilidade funcionar, subjugavam uma classe inteira. Apesar do autor ser declaradamente socialista, sua visão sobre esses sistemas era grandemente pessimista (P.S: Wells era conhecido como socialista utópico, diferente do socialismo científico ou marxista, no qual se baseia o comunismo).

“Ao olhar para aquelas estrelas, de repente tive ciência da insignificância dos meus próprios problemas e de toda a gravidade da vida terrestre. Pensei na distância incalculável  no vagar lento e inexorável dos seus movimentos de um passado desconhecido para um futuro desconhecido.”

Creio que a falta de nomes aos personagens tenha sido proposital, já que isso cria uma certa atemporalidade para a trama. Não apenas por isso, mas também pelo debate que há na narrativa sobre o futuro da sociedade humana como um todo. Claro que não há meio de sabermos o que vai acontecer daqui 3000 anos, mas não é impossível dizer que diante de determinados contextos (a atual situação política do país, por exemplo) tal história possa parecer verossímil (ou até mesmo positivista, considerando que os humanos não se extinguem em uma terceira guerra nuclear ou biológica).

A edição trazida pela Suma está belíssima e apresenta conteúdos extras que outras edições já publicadas do livro no Brasil não possuem. Há desenhos exclusivos, por exemplo, ilustrando determinadas partes da narrativa, o que agrega ainda mais na experiência de leitura. Há também um prefácio escrito pelo tradutor desta versão, comentando a respeito da importância da obra. Ao final há um apêndice escrita pelo próprio autor para as suas primeiras versões, comentando sobre o impacto que a escrita desse livro trouxe para sua vida como escritor, observador e pessoa. É um livro muito bonito para se ter em qualquer estante.

Eu já havia lido a obra ano passado, mas a releitura se mostrou tão agradável quanto fora a primeira vez. Fiquei muito contente em encontrar uma história boa e bem montada, mesmo sendo tão escassa no que se refere à ficção científica. É uma pena que não se possa dizer o mesmo das adaptações que foram feitas baseadas na obra. Ainda que peguem a mesma ideia, não chegam perto da sensibilidade filosófica de H.G. Wells aplicou em sua narrativa.

A MÁQUINA DO TEMPO

Autor: H. G. Wells

Editora: SUMA

Ano de publicação: 2018

A bordo de sua Máquina do Tempo, o cientista que narra esta história parte do século XIX para o ano de 802701. Nesse futuro distante, ele descobre que o sofrimento da humanidade foi transformado em beleza, felicidade e paz. A Terra é habitada pelos dóceis Eloi, uma espécie que descende dos seres humanos e já formou uma antiga e enorme civilização. Mas os Eloi parecem ter medo do escuro, e têm todos os motivos para isso: em túneis subterrâneos vivem os Morlocks, seus maiores inimigos. Quando a Máquina do Tempo que levou o Viajante some, ele é obrigado a descer às profundezas para recuperá-la e voltar ao presente.
Misturando uma imaginação singular, um tema inovador e muitas reviravoltas, A Máquina do Tempo foi o primeiro romance publicado por H. G. Wells, em 1895. Chamado de gênio e considerado um pioneiro, Wells abriu caminho não só para seus livros e sua visão de mundo, mas para novas possibilidades na literatura.

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