E não é que é bom?!

Quando ouvi falar de Com Amor, Simon pela primeira vez eu logo previ: vai ser um filme de adolescente descompromissado, sem responsabilidade política, com falhas de representatividade, feito para lucrar em cima da onda de “jovens desconstruídos” recente. Eu gosto dessa onda, sou parte dela, mas meus ideais me impedem de aproveitá-la ao máximo, porque penso muito na parte política e na responsabilidade social necessária para tratar desses temas. Por isso, estabeleci preconceitos quanto a Com Amor, Simon, porque, em suma, não queria ver uma comédia romântica adolescente tradicional tratando pessoas homossexuais da mesma forma como pessoas heterossexuais. Para minha surpresa, o filme não faz isso. E eu adorei.

Expliquei tudo isso logo de cara porque a minha surpresa com Com Amor, Simon foi muito agradável: percebi que não precisa ser categórico e explícito para fazer bem. O filme correspondeu às minhas expectativas – não é muito político, não se leva a sério e foi feito para lucrar com os pós-modernos -, mas ele é ótimo.

Com Amor, Simon conta a história de Simon Spier, um jovem de 17 anos, morador de um subúrbio americano, cuja vida é completamente normal e trivial, a não ser por um segredo: ele é gay. Enquanto jovens adolescentes heterossexuais crescem assistindo dezenas e dezenas de filmes sobre o colegial, com seus beijos técnicos e enredos de superação e perseverança, nós adolescentes gays temos uma das primeiras oportunidades aqui, porque o segredo de Simon é o protagonista da história – e muitos de nós vivemos este segredo.

A trama começa quando alguém de seu colégio publica que é gay na internet, anonimamente, e Simon inicia uma conversa para compartilhar experiências. Enquanto ambos se mantêm sob pseudônimos, acompanhamos dois jovens que não sabem seus nomes verdadeiros se apaixonarem através da internet – algo bem atual, não é? Mas esse cenário se complica quando um outro colega, Martin, descobre sobre as conversas e ameaça publicá-las, a menos que Simon consiga juntá-lo com sua amiga, Abby.

Uma confusão digna de Shakespeare se desenvolve, com Simon ao centro, fazendo de tudo para proteger seu segredo: incluindo manipular seus amigos e criar situações desagradáveis. Eventualmente, ele sai oficialmente do armário (não é um spoiler, juro, o filme é sobre isso); identidades são reveladas, corações quebrados e famílias desestabilizadas. Mas, prometo, é um final feliz.

O filme, dirigido Greg Berlanti, discorre de forma orgânica sobre essa confusão, deslizando por entre a vida de Simon com seus amigos, sua família e seu correspondente. Enquanto Simon muda de suspeita quanto à identidade de seu crush, acompanhamos esse passo-a-passo, e torna-se evidente que é uma adaptação literária, tornando o segundo ato mais divertido do que pesado. E quando as coisas de fato explodem, a direção tem a mão suficientemente leve para tratar dos sentimentos dos protagonistas e criar cenas críveis para sentirmos junto com eles – algumas cenas são especialmente comoventes, e, não à toa, são as mais políticas do filme, como a que Simon divide com Ethan na cafeteria da escola ou a cena em que conversa com seus pais sobre sua sexualidade.

Toda essa história permite que Nick Robinson (de The Kings of Summer e Jurassic World) e Katherine Langford (de 13 Reasons Why) entreguem atuações sólidas como Simon e sua melhor amiga, Leah; no entanto, os diálogos mal escritos fazem com que as fraquezas do elenco de coadjuvantes adolescentes fiquem ainda mais expostas, então é um pouco decepcionante. O elenco de adultos inclui Jennifer Garner no papel da mãe de Simon (eu amei), Josh Duhamel no papei de pai (nada de interessante) e Tony Hale, da série Veep, no papel do vice-diretor da escola (no limite entre o engraçado e o ofensivo).

A jornada de Simon até sair do seu armário não é muito grandiosa, toca em poucas das feridas que incomodam os jovens gays ao redor do mundo e trata do assunto no auge de sua zona de conforto: Simon é branco, de classe média alta, tem amigos e família que o apoiam a todo custo e a sombra de homofobia que paira sobre ele revela-se pequeníssima. Mas talvez estejamos prontos para esse tipo de filme. Talvez seja de fato saudável termos um filme assim, bobinho, que trata de pessoas homossexuais lidando com problemas adolescentes comuns, com finais previsíveis e trilhas sonoras exageradas. Se for assim, Love, Simon é uma obra de arte. Porque, afinal, jovens heterossexuais tiveram Gatinhas e Gatões, Meninas Malvadas, 10 Coisas Que Odeio em Você, dezenas de American Pie, As Patricinhas de Beverly Hills e até High School Musical, então talvez não machuque que os adolescentes gays de hoje e amanhã tenham Love, Simon.

Porque mesmo ficando nessa zona de conforto, o filme constrói bem seus personagens – todos eles -, cria momentos de identificação fortes e passa uma mensagem coesa. No final, mesmo com as situações absurdas que acabam ocorrendo com eles, senti que esses personagens realmente são pessoas que existem – e isso é algo que não acontece com frequência nestes filmes de adolescentes.

O humor e os conflitos fazem com que o filme passe uma mensagem terna, não de aceitação ou anti-homofóbica, mas de amor e confiança no mundo ao redor. Como eu disse, o segredo de Simon é o protagonista – não estamos debatendo se ser gay é errado ou não, se é uma fase ou não, se é difícil ou não, estamos falando sobre o momento em que você decide revelar este fato ao mundo, e o por quê disso. Entender esta mensagem é importante porque alguns podem dizer que o filme não faz jus à comunidade que representa – o que é bem verdade -, mas também é verdade que não se propõe a isso.

No fim das contas, é um filme doce, fofo e tolo, que representa uma parte bem pequena da comunidade gay (que já é só o G dentro do LGBT), mas que pode, sim, ser assistido por qualquer um no tédio de uma tarde de sábado ou numa festa do pijama com os amigos.

COM AMOR, SIMON

Diretor: Greg Berlanti

Elenco: Nick Robinson, Jennifer Garner, Josh Duhamel e mais

Ano de lançamento: 2018

Aos 17 anos, Simon Spier (Nick Robinson) aparentemente leva uma vida comum, mas sofre por esconder um grande segredo: não revelou ser gay para sua família e amigos. E tudo fica mais complicado quando ele se apaixona por um dos colegas de classe, anônimo, na internet.

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