Dirigido pela cantora e compositora norte-americana Taylor Swift e contando com a presença dos também músicos Jack Antonoff e Aaron Dresner, “Folklore: The Long Pond Studio Sessions” é um filme-documentário lançado em 25 de novembro de 2020 no serviço de streaming do Disney Plus e apresenta a experiência dos três artistas acerca da criação do álbum “Folklore”, produzido a distância durante o isolamento social instaurado devido a situação da pandemia.

Indicado ao Grammy 2021 como álbum do ano, “Folklore” quebrou diversos recordes em charts da música durante o ano de 2020 ao passar 47 semanas no topo da Billboard 200 e sua composição coleciona narrativas pessoais e introspectiva sobre como os seres humanos lidam com situações de incerteza e confusão. É por meio desse lado mais pessoal da criação artística que o documentário trata questões como medo, angústia, amor e dúvida, bem como apresenta pela primeira vez os três compositores tocando juntos as músicas dos álbuns, já que durante toda a criação do “Folklore” eles não haviam se encontrado pessoalmente.

Gravado com uma câmera robótica para seguir com as normas da Organização Mundial da Saúde e seguindo demais protocolos de proteção, “Folklore: The Long Pond Studio Sessions” exibe o curioso lado da composição de músicas em um momento tão atípico quanto o de 2020, apresentando as decisões artísticas e inspirações pessoais ou externas que auxiliam na hora de criar uma letra ou uma melodia. Introspectivo, reflexivo e recheado de conversas divertidas e inspiradoras entre Taylor, Jack e Aaron, o documentário mescla as apresentações das músicas com depoimentos dos três e revela curiosidades sobre o álbum e sobre os novos processos de criação de produtos artísticos durante o atual “novo normal”.


Iniciando com um vídeo caseiro gravado por Taylor em 21 de maio de 2020, o documentário apresenta pequenos momentos da cantora durante os meses iniciais da quarentena e nos momentos em que ela percebeu que estava aos poucos compondo aquele que seria o seu álbum surpresa: Folklore. Acostumada a grandes estúdios, Taylor inicia os depoimentos do dia 21 de maio comentando o quanto está animada e nervosa por vivenciar essa experiência mais caseira pela primeira vez. Em rápidos momentos, a cantora apresenta a organização feita em seu apartamento para transformá-lo em um estúdio e como ela e a engenheira de som, Laura, dividiram-se para organizar as gravações enquanto Jack Antonoff, o coprodutor do Folklore, ficava em contato com as duas por uma chamada online diretamente de Nova York.

Em questão de pouquíssimos minutos já somos assim apresentados a um novo tipo de produção que demonstra com grande objetividade esse novo aspecto da produção artística: a distância e apoiando-se na tecnologia para reunir as pessoas. É interessante acompanhar mesmo que de forma amadora como que o desenvolvimento do álbum se deu em meio ao período incomum e turbulento a qual 2020 está submetido e já garante um início de documentário que prende a atenção por ser pessoal, leve e ainda assim instigante, características que vão se repetir nos momentos seguintes.

Com uma introdução em texto e gravações de ampla distância daquele que seria o long pond studio, o documentário apresenta também o contexto geral do álbum: gravado durante o isolamento, pela primeira vez Taylor e seus colaboradores irão tocar juntos as músicas compostas e lançadas de surpresa em 24 de julho de 2020. Em instantes, o filme conduz o espectador para uma divertida conversa entre Jack, Aaron e Taylor, apresentando suas principais sensações durante o início do isolamento e como eles transformaram a confusão inicial e sensação de impotência diante do que Jack denomina ser a “destruição das nossas rotinas” em algo que os fez ao menos sentir-se como parte de algo e os ajudou de certo modo. Juntos pela primeira vez, os três apresentam a expectativa de tornar concreto aquilo que até então só tinha sido produzido digitalmente, com Taylor Swift concluindo a situação ao dizer que finalmente tocar o álbum o tornará legitimo e não mais algo que não parecia ser apenas uma miragem até ali.

É nessa troca de conversas iniciais que uma das frases que melhor define o documentário é proferida por Taylor: “Porque se nós vamos ter de mudar tudo, devemos começar com o que mais amamos”. Ao abordar a experiência de criativamente produzir para escapar ou ao menos entender a si mesmo durante momentos de angústia, os momentos iniciais do filme já garantem aquilo que o torna tão especial, uma vez que é a conexão com os sentimentos partilhados diante de tantas mudanças que faz com que sintamos que de algum modo estamos lá com os três naquela troca de conversas e que partilhamos das emoções de “liberação emocional” com a qual a cantora traduz sua relação com o álbum.

O acerto da produção ao mesclar as músicas com as reflexões compartilhadas é também outro dos principais motivos que tornam o documentário tão especial. Por si só, as músicas já possuem grande apego emocional e apreciativo para aqueles que são fãs ou somente ouvintes, mas acompanhadas dos comentários pessoais dos três músicos sobre como foi produzir determinadas faixas, qual a inspiração que gerou aquela letra e quais interpretações ou sentimentos podem ser tirados de distintas formas para cada um deles dentro daquela melodia… tais elementos fazem com que o documentário torne-se ainda mais impressionante, pois alinha simplicidade com a sensação de conforto e compreensão a medida que as conversas abordam temas como medo, ansiedade, insegurança e depressão.

Seguindo a ordem do álbum, o documentário começa as sessões de apresentação musical com a faixa “The 1”, que ao abordar os sentimentos de se olhar para trás, para alguém que você já amou antes e que agora já não está mais com você, apresenta com uma melodia leve a perspectiva de se pensar o que poderia ter sido caso as decisões tivessem sido diferentes. Ao tratar sobre as interpretações do que a letra significa, Taylor e Aaron conversam sobre a possibilidade da música também ter capturado o momento de produção do próprio álbum já em seus primeiros versos: “I’m doing good, I’m on some new shit. Been saying yes instead of no” ou: “Eu estou bem, estou fazendo coisas novas. Estive dizendo sim ao invés de não” apresenta a perspectiva de se tentar criar novidades em momentos que não aparentam ser próprios para isso e que, em meio a isso, é preciso tentar dizer mais sim do que não para as possibilidades da inspiração.

Essa perspectiva traduz boa parte do que é discutido no documentário: arriscar-se criativamente em um momento como esse e testar coisas novas decorre de uma vontade de adaptar-se em meio a turbulências e o espaço artístico é um dos meios para se conquistar essa gama de possibilidades, de se dizer mais “sim” para suas próprias ideias. Além de ser uma perspectiva curiosa e bem bonita sobre a arte, também apresenta correlações que ressoam com nossos próprios sentimentos e vontades, tornando a música mais do que uma faixa de abertura, mas principalmente um meio de compreender todo o sentimento do álbum e, por consequência, do documentário.

As conversas também apresentam revelações sobre o álbum que antes eram apenas teorias de fãs: o compositor “desconhecido”, William Bowery”, tem sua identidade revelada por Taylor ao tratar das faixas em que ele é creditado: Exile, dueto da cantora com Bon Iver e “Betty”, a música mais country da produção e que faz parte do “triangulo amoroso” composto de modo ficcional pela Taylor. Inclusive, essa é uma das conversas que a cantora troca com os outros dois músicos, revelando que, por estar tão acostumada com a ideia de criar álbuns autobiográficos, ela raramente deixava-se compor por meio da ficção, trazer histórias que não fossem suas e essa foi uma das amarras das quais ela aprendeu a livrar-se enquanto crescia como compositora e ter projetado o triangulo amoroso por meio das faixas do álbum foi uma experiência da qual ela adorou fazer parte.

A gravação ter sido feita por meio de uma câmera robótica e organizada pela própria Taylor também fornece para o documentário um tom de confissão e bate papo caseiro, só que adornado por uma excelente qualidade de imagem que dão o clima certo de “show caseiro” com “diálogo entre amigos”. As performances são excelentes, muitas das músicas ganham outra sensação quando colocadas em live e ver a animação de Jack, Aaron e Taylor na hora de tocar é imprescindível para se sentir parte da experiência. “Exile”, dueto de Taylor com Bon Iver indicado a categoria de “Best pop duo or group” no Grammy 2021, é cantado a distância, com o cantor Justin Vernon interpretando sua parte em seu isolamento e Taylor no dela, ao lado de Jack e Aaron e é uma das faixas mais bonitas de ser ouvida, mesmo que não tocada presencialmente pelos dois músicos, o que mostra um novo tipo de modo de apreciar filmes e shows feitos separadamente, mais um dos indícios das diversas alterações ocorridas em 2020.

Pessoais em seus relatos, Jack e Aaron também falam das suas interpretações das músicas, Aaron fala bastante sobre o que significa para ele a faixa “Peace”, que aborda a visão sobre o amor e o quão suficiente você se sente ao não poder dar tudo que deseja para a pessoa que ama. Ao falar de “My tears Ricochet”, a famosa faixa 5, conhecida entre os fãs de Taylor por ser uma composição ainda mais pessoal do que as demais do álbum, Jack e Taylor conversam sobre como é cruel sentir que a pessoa em quem você mais confiava tornou-se aquela que mais poderia te machucar justamente por te conhecer. Diálogos como esses são aqueles que aprofundam a conexão do telespectador e tornam a produção ainda mais introspectiva.

Outras faixas, como “Epiphany” apresentam uma versão de Taylor sobre a história de seu avô, que nunca conversou sobre a família acerca de algumas situações desumanas que viveu na 2° guerra mundial e a cantora relaciona a música com a atual situação das equipes de saúde trabalhando nos hospitais, os traumas que o cenário caótico pode ter provocado e como muitas dessas pessoas jamais falarão sobre isso de novo. Momentos como esse relembram o espectador sobre todo o contexto em que o álbum se insere: produzido em meio a uma pandemia, o álbum pode não falar sobre ela, mas os sentimentos gerais de angústia, medo e desgaste estão presentes por meio das histórias que as faixas contam, sejam nas suas letras ou em seus tons.

O documentário também apresenta as visões de Taylor sobre seu trabalho e processo criativo enquanto compositora. Ao falar de “Mirrorball”, Taylor comenta com Jack Antonoff sobre as vezes visualizar uma imagem nítida em sua cabeça na hora de compor uma música e como essa construção a levou a compor a faixa, que apresenta uma letra que tanto fala um pouco sobre o que por vezes Taylor sente ao ser uma pessoa pública, quanto também abraça os espectadores ao falar sobre sentimentos de sentir-se sempre representando versões de si para diversas pessoas e tentar fazer isso dar certo quando por vezes não funciona, ecoando, assim, o sentimento humano de cansaço em que há momentos que variar tanto em diversas situações distintas pode ser exaustivo mesmo que seja algo que saibamos fazer há tanto tempo.

Ao encerrar falando de “The Lakes”, a faixa bônus do álbum, Taylor e Jack conversam sobre as sensações de pertencimento e escapismo em meio ao período que vivenciamos e coroam o final do documentário com um tom ainda mais reflexivo do que o já propagado por todos os minutos anteriores.

Assim, com uma gravação e direção simples, dividas entre as músicas apresentadas em live e as trocas de conversas entre os músicos, “Folklore: the long pond studio sessions” transforma-se em um documentário de conforto, introspecção e empatia ao abordar os múltiplos sentimentos humanos de raiva, medo, amor e incerteza que aos poucos são transformados em letras e melodias, mostrando não apenas a capacidade da arte de ser catalizadora ou um meio possível de permitir a liberação de sentimentos que normalmente não seriam expostos, mas também o processo criativo de um álbum, bem como as distintas técnicas que permitem que uma produção seja feita de forma tão distinta em meio a uma situação tão atípica quanto a de 2020.

Envolvente, confortante e singelo em seus diálogos, o documentário é a escolha certa não apenas para os fãs da cantora, mas também para aqueles que desejam conhecer um pouco mais do processos de composição de músicas e para quem espera reconhecer nos diálogos e nas letras comentadas os sentimentos que também já a afetaram em situações anteriores e principalmente em meio ao isolamento, pois, apesar de não falar sobre a pandemia, o álbum fala sobre como diferentes meios de se lidar com a situação são gerados em nossos corações e nas nossas emoções e é quase certo que muitos desses momentos de reflexão vão correlacionar-se com os seus também.

Folklore: The Long Pond Studio Sessions

Diretor: Taylor Swift

Elenco: Taylor Swift, Jack Antonoff, Aaron Dessner, Justin Vernon

Ano de lançamento: 2020

Em ‘Folklore: The Long Pond Studio Sessions’, Taylor Swift executa cada música na ordem de seu álbum, ‘folklore’ e revela as histórias e segredos por trás de todas as 17 faixas.

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