Garotas de Neve e Vidro é o primeiro romance da autora americana Melissa Bashardoust e é um lançamento da Plataforma 21.

SOBRE O LIVRO

Em uma espécie de reconto de um dos contos de fadas mais clássicos, A Branca de Neve, Lynet, aos dezesseis anos, é uma princesa rebelde por dentro, mas, por fora, tudo o que veem é a delicadeza de suas feições e sua semelhança com a mãe, a já falecida rainha  do reino de Primavera Branca. Sua madrasta, Mina, ao contrário, sofre com a fama de um pai que é temido por todo o reino, inclusive pelo seu próprio marido, o rei, e tenta usar sua inegável beleza para conquistar a confiança daqueles que a cercam e fazê-los esquecer de quem é seu pai.

“Sei que isso pode ser difícil para você entender agora, mas quando ficar mais velha, você não vai poder confiar que Mina vá sempre querer o melhor para você”.

Primavera Branca, já há muitos e muitos anos, vive imersa em uma espécie de maldição, a qual faz com que o lugar viva para sempre imerso no mais rigoroso dos invernos. Em meio a um contexto de muita dor e solidão, Mina e Lynet são forçadas a confrontar o papel que foi determinado para elas e tomar uma decisão: continuarão sendo o que se espera delas ou se tomarão a caminho mais difícil, o da oposição, e, quem sabe, descobrir que elas podem ser muito mais do que foram ensinadas a acreditar?


MINHA OPINIÃO

Embora as referências à história da Branca de Neve sejam claras, um das coisas mais interessantes desse livro é que ele não se limita a ser um reconto. A história usa muito, sim, os elementos originais, como as referências à neve, o envenenamento como arma, entre outras. Porém, estes mesmo elementos ganham outras formatos, dando origem a uma história com voz própria, em que o conflito entre a enteada e a madrasta tem camadas muito mais complexas que a pura inveja sugerida no conto de fadas.

É nesse ponto, inclusive, que podemos ver uma forte influência de ideias feministas e de sororidade na escrita da autora. Pois, invés de permitir que os conflitos entre as duas nasçam de uma rivalidade feminina naturalizada, ela faz com que os mesmos nasçam do passado de Mina, da forma como ambas são tratadas pelos homens em suas vidas, além de uma série de outros fatores, muitos deles frutos de revelações surpreendentes que vamos tendo ao longo da narrativa.

Ao fazer a escolha de dividir sua narrativa entre a voz de Mina no passado e a voz de Lynet no presente, a autora estabelece um paralelo bastante interessante, pois acompanhamos as duas personagens com a mesma idade, aos dezesseis anos. Isso acaba sendo um fator especialmente importante na construção da personagem Mina, pois é graças a essa forma de contar a história que temos a chance de conhecer tanto a sua versão jovem quanto a sua versão mais velha e vamos, aos poucos, ligando os pontos e descobrindo o que aconteceu no passado para fazer com que ela se tornasse a pessoa que estamos vendo no presente.

“E o fato de as duas serem a mesma, de a garota e a cirurgiã poderem existir livremente na mesma pessoa, era para Lynet o verdadeiro significado de possibilidade – de liberdade”.

Em meio a disputas políticas e a personagens tentando se afirmar em sua individualidade, temos nesse livro também um romance lésbico muito bem construído. O relacionamento entre essas duas personagens não chega a tomar o protagonismo da história que realmente importa, mas acaba sendo parte relevante da história, pois cada uma serve de impulsão para que a outra cresça e veja determinadas situações pelos olhos da outra. É um relacionamento que, em vez de passar uma mensagem centrada no romance, mostra ao leitor como frequentemente a influência de uma pessoa que parece ser totalmente diferente de você pode ser importante para você crescer e descobrir seus limites, verdadeiros ideais, erros e acertos.

Lynet é uma heroína forte e de grande poder feminista, mas ela também erra. Ela é incrivelmente humana e, por isso, com todas as suas especificidades, conseguimos nos identificar mais com ela do que com muitas outras heroínas que a fantasia Young Adult tem produzido recentemente. A autora expõe Lynet em toda a sua vulnerabilidade e, ao fazê-lo, torna ainda mais poderosa que se a apresentasse como uma guerreira invencível. 

“Há coisas piores no mundo que ser delicada. Se você é delicada, significa que ninguém tentou quebrar você”.

De leitura muito fluida, o livro é em capa mole, o que eu sei que não agrada todo mundo, mas para mim colaborou bastante para o conforto da leitura, pois deixou a obra bem mais leve e tornou a leitura super confortável. A diagramação também está ótima, com margem e letras grandinhas, embora a capa tenha deixado um pouco a desejar, não por não ser bonita, mas porque ficou um pouco genérica, sem muitos elementos específicos dessa história.

Esta é, desse modo, uma excelente fantasia jovem, com um toque feminista muito bem construído e duas personagens envolventes, tão falhas como apaixonantes. É um prato cheio para os fãs de contos de fadas, claro, mas também deve agradar quem curte uma leitura que conquista o leitor e não o deixa mais largar o livro até o final. E, para aqueles que não gostam de ficar presos em séries, uma boa notícia: é livro único!

GAROTAS DE NEVE E VIDRO

Autor: Melissa Bashardoust

Editora: Plataforma 21

Ano de publicação: 2018

Mina é filha de um mago cruel e sua mãe está morta. Aos dezesseis anos, seu coração nunca bateu por ninguém – na verdade, ele jamais pulsou de forma alguma, e Mina sempre achou esse silêncio normal. Ela nunca suspeitou que o pai arrancara seu coração e, no lugar, colocara outro de vidro. Então, quando Mina chega ao castelo de Primavera Branca e vê o rei pela primeira vez, ela cria um plano: conquistá-lo, tornar-se rainha e finalmente conhecer o amor. A única desvantagem desse plano, ao que tudo indica, é que ela se tornará madrasta. Lynet tem quinze anos e é a imagem de sua falecida mãe. Um dia, descobre que um mago a criou à semelhança da rainha morta, a partir da neve. No entanto, Lynet preferiria ser forte e majestosa como sua madrasta, Mina. E realiza seu desejo quando o pai a torna rainha dos territórios do sul, tomando assim o lugar de Mina. A madrasta, então, começa a olhar para a enteada com algo que se assemelha ao ódio, e Lynet precisa decidir o que fazer – e quem quer ser – para ter de volta a única mãe que de fato conheceu… ou simplesmente derrotar Mina. Garotas de neve e vidro traça a relação de duas mulheres fadadas a serem rivais desde o princípio – a não ser que redescubram a si mesmas e deem novo significado à história que lhes foi imposta. Este aclamado reconto feminista de Branca de Neve nos leva a um mundo singelo e, ao mesmo tempo, maravilhoso. Uma poderosa releitura para mantê-lo sempre atual e presente.

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