O Sol Desvelado é o segundo livro da Série dos Robôs, escrito por Isaac Asimov. Foi relançado pela editora Aleph 2014.

*Essa resenha pode conter spoilers do livro anterior.

SOBRE O LIVRO

Após resolver o crime do Sideral na Terra, o detetive Elijah Baley vai se envolver em um novo caso, mais complicado e perturbador. Neste novo caso, ele será enviado ao planeta Sideral Solaria, onde existem aproximadamente  de dez mil robôs para cada um dos 20 mil humanos que moram lá. Apesar dessa disparidade, ambos vivem em perfeita harmonia… ou era o que se acreditava até um importante morador local ser morto… dentro da própria casa.

Porém, esse caso se mostrará mais incomum e complicado, pois todas as circunstâncias apontam para um assassinato impossível. Então, como ele aconteceu? O vizinho mais próximo morava há quilômetros de distância; as máquina são programas com as Três Leis, e a esposa do homem não se encontrava no local quando o crime aconteceu. Diante deste impasse, Baley se junta mais uma vez com – agora amigo – Daneel Olivaw, o robô extremamente humanoide e de humor ácido. Juntos vão procurar por pistas, listar suspeitos e, aos poucos, se deparar com um segredo perigoso.

“Um detetive é um sociólogo também; um sociólogo por uma questão de experiência e de prática, caso contrário não seria um bom detetive.”

Ao mesmo tempo, Elijah Baley vai enfrentar o seu medo por espaços abertos e descobrir que naquele mundo, palavras e gestos tão comuns na Terra podem ter sentidos profundamente diferentes, podendo até mesmo ser visto como mal educado. Baley verá o sol como ele é, e uma nova visão de humanidade se abrirá à sua frente.


MINHA OPINIÃO

Na resenha do livro anterior desta série ficou claro como Asimov me conquistou com suas intrincadas histórias de robôs, investigação e paralelos com a realidade. Aqui nesta continuação mais uma vez o autor me surpreendeu com a sua capacidade de ir além e imaginar um mundo totalmente diferente do nosso e tocar em temas tão profundos e relevantes, como a diferença cultural entre os povos. Há muita coisa a se falar sobre esta continuação, mas procurarei ser breve para manter as surpresas reservadas à quem for fazer a leitura.

Solaria é um planeta bem incomum. Fica em algum ponto distante da galáxia, mas relativamente perto para que humanos possam visitá-lo viajando em uma nave. Apesar disso, a relação entre os planetas Siderais e a Terra é bem complicada. Nossa morada é vista como planeta mais sujo e inóspito, desprezado pelos Siderais em termos tecnológicos e considerado uma zona perigosa devido à probabilidade de contágio de doenças. Somos o patinho feio do universo, o último lugar a ser considerado lar, mesmo que os colonos iniciais tenham partido daqui.

“Azul, verde, ar, barulho, movimento e, acima de tudo, brilhando com fúria e de forma implacável e assustadora, estava a luz branca que vinha de uma bola no céu. Ele olhou para o sol desvelado.”

Ao contrário da Terra que tem uma grande aversão por máquinas, em Solária a população é majoritariamente positrônica. Cada pessoa dispõem de dez mil máquinas para si, e isso tem uma grande razão: moram no planeta só 10 mil pessoas, há controle de natalidade e, principalmente, cada um vive o mais distante possível de qualquer outra pessoa. Estranho? Pois bem, em Solaria é altamente repudiado o contato humano, sendo que isso só é feito em casos extremamente necessário. A solidão é incentivada ao extremo, mas apesar disso, as pessoas vivem em perfeita saúde e harmonia. Toda a comunicação é feita através de telas e intercomunicadores. O trabalho pesado é por conta dos robôs.

É interessante essa ambientação de Solaria, pois ela é exatamente o oposto da Terra explorada em As Cavernas de Aço. Enquanto aqui a população vive isolada do mundo exterior, lá os humanos podem sair para caminhar no campo, respirar ar puro e ver o sol como ele é. Mas o grande diferencial desse planeta tão utópico está em sua estrutura política e cultural. As pessoas são incentivadas desde pequenas a evitar ao máximo qualquer contato físico com outro ser humano e a gastarem energia somente com coisas recreativas e de interesse pessoal. Dado esse condicionamento, a taxa de criminalidade é de 100%, e não há policiais, xerifes ou delegados.

“Alguém poderia dizer que precisamos tornar os humanos melhores. Isso é impossível, então tornaremos o robô mais seguro.”

Confesso que foi bem curioso acompanhar o personagem Elijah tendo que aprender a se portar nesse novo mundo. É como se ele fosse um estrangeiro jogado em um país com uma língua totalmente nova. De começo, Baley tem atitudes normais como qualquer terráqueo, mas aos  poucos vai notando que ali há uma grande diferença de significado e compreensão de certos costumes e expressões. Para um solariano, “ver” e “olhar” possuem sentidos bem diferentes daqueles que temos aqui na Terra. Tanto é que soa extremamente ofensivo dizer para um solariano que você gostaria de vê-lo.

É um grande choque de cultura para o personagem, e de certa forma pode-se fazer um paralelo com o nosso mundo real. Há inúmeras culturas diferentes espalhadas  pelo globo, cada uma com suas “esquisitices” e manias. Algumas, talvez, podem soar enjoativas ou até mesmo bizarras, enquanto outras só estranhas. Da mesma forma que alguns de nossos costumes e manias podem ser mau vistos por pessoas de outros lugares com culturas diferentes (nos EUA, por exemplo, não é comum dar beijos e abraços como forma de cumprimento, já no Brasil isso é bem comum. Em outros lugares, é extremamente ofensivo deixar sobras de comida no prato, e por aí vai..).

“De repente, ele visionou a Terra como uma bola de pedra com uma película de umidade e gás, exposta ao vazio por todos os lados, com suas Cidades que mal se fixavam na camada mais exterior, construídas de maneira precária entre a rocha e o ar.”

Outro ponto positivo da trama é ver a relação entre o protagonista e o robô Daneel Olivaw sendo amadurecida, deixando-se de lado o preconceito por máquinas e aceitando que tanto elas quanto nós temos nosso espaço no universo. Só porque uma foi criada por nós não quer dizer que seja inferior. Afinal de contas, o mundo hoje é altamente dependente de máquinas e sem elas grandes feitos da sociedade seriam impossíveis. Claro que essa mudança é gradual, por isso em alguns momentos vermos o detetive se comportar de forma grosseira e com ar de superioridade. Mas já está bem melhor do que no início da série.

Como eu disse no começo, daria pra falar bastante sobre esse livro, tamanho a complexidade e genialidade do mundo criado por Asimov. Mas isso tiraria todo o brilho que é ir lendo e descobrindo as mensagens aos poucos. De fato, é uma narrativa menos fluida se comparada ao livro anterior. Aqui o foco é em como os personagens se comportam em um mundo diferente do seu e como aos poucos eles vão compreendendo as significativas diferenças e suas implicações sociológicas. Mesmo assim, isso não muda o fato de que é um ótimo livro e que vale a pena ser lido.

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O SOL DESVELADO

Autor: Isaac Asimov

Editora: Aleph

Ano de publicação: 2014

Depois das surpreendentes reviravoltas de sua última missão, o detetive Elijah Baley é recrutado para investigar um novo caso de assassinato aparentemente insolúvel. Obrigado a enfrentar sua fobia de espaços abertos, Baley viaja até Solaria, um planeta Sideral de escassa população – apenas 20 mil habitantes –, mas onde cada ser humano dispõe de um contingente de 10 mil robôs positrônicos a lhe servir. Nessa empreitada, Baley contará novamente com a ajuda de R. Daneel Olivaw, seu inusitado parceiro no caso anterior. Mas, desta vez, a missão de ambos não será tão simples; afinal, por onde começar uma investigação em que um dos suspeitos sequer poderia estar na cena do crime e o outro, um robô, é rigorosamente programado para não ferir um ser humano?

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