Corpo Estranho é o livro de estreia da autora nacional Maria Teresa Santoro Dörrenberg e é um lançamento publicado pela editora Empíreo.

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SOBRE O LIVRO

Mear é um ciborgue que atua em uma exposição de tecnologia em um museu de Berlim. Sua tarefa, dia a dia, é rodar uma espécie de vídeo, falar algumas frases e ficar imóvel para que os visitantes o vejam. Mear é um robô com cérebro humano, e sua existência, por si só, já é algo inovador e audacioso. Mas ao mesmo tempo que sua existência é algo fantástico, é também um mistério. O seu projeto estava em desenvolvimento há anos por Camila e Antônio, até que um dia, começou a funcionar como se tivesse sido tocado por um deus. Por conta disso, seus criadores desejavam vendê-lo para cientistas japoneses, que estavam muito interessados em seu funcionamento.

“É tudo tão excitante. Conhecer você e o mundo é um privilégio. Não quero enferrujar num museu ou num laboratório. Mas para isso eu preciso de autonomia, como você disse.”

Mear até então nunca questionara as decisões tomadas por seus criadores, até um dia conhecer O., uma artista que usa o próprio corpo para expressar a arte. Durante vários dias, O. e Mear vão trocando conversar e cada vez mais a relação entre os dois fica estreita, até que O. sugere que Mear deveria ser independente, já que ele possui consciência, diferente dos robôs convencionais. Seus criadores não acreditam na ideia e decidem proibir Mear de conversar com a artista.

Mas um dia, ao final do expediente do museu, após Mear fazer um passeio pelo local e conversar com outros projetos de robôs, decide que seu futuro não é ser mandado por humanos. Ele quer ser independente, e O. é a solução para ele. Com ela, ele traça um plano de fuga, e com isso, inicia sua aventura. Descobrindo as funções do próprio corpo e acreditando que pode ser quem ele quiser, Mear partirá para o passado afim de conhecer mais sobre o corpo humano e, principalmente, sobre o próprio corpo.

“Leonardo apenas o contemplou. Depois se virou rapidamente para apanhar um instrumento de medição.”

Nessa incrível aventura por grandiosas obras de arte da antiguidade, Mear encontrará não só representações fantásticas do corpo humano, mas também, aprenderá o que nos faz humanos por essência e, diante disso, despertará sentimentos que até então ele julgava ser impossível ser sentido por um robô.


MINHA OPINIÃO

Corpo Estranho foi uma experiência literária que transcendeu o gênero fantástico ou científico. Claro que houve pontos negativos ou que poderiam ter sido melhor trabalhados, mas em geral foi uma leitura leve, cativante e reflexiva.

“Mear pensava nessa madona toda vestida, sem quase denotar um corpo dentro da roupa. Era um corpo espiritual, a serviço de deuses pudicos, a serviço da salvação da alma. O quadro era repleto de simbolismo.”

O que poderia ter de comum entre o enredo do filme O Homem Bicentenário e o livro Corpo Estranho? A resposta é simples: um robô que deseja encontrar seu lugar no mundo humano. No filme, o androide (interpretado por Robin Williams) é levado para trabalhar na casa de uma família e, com o tempo, cria um grande laço afetivo com a filha pequena do casal, o qual ele a chama de “menininha”. Ao longo da trama, o androide busca sua independência e, também, ser reconhecido como um ser humano. Em Corpo Estranho, a narrativa segue essa linha, onde o ciborgue (híbrido humano e robô) procura compreender o que o diferencia dos humanos e qual o propósito de sua criação.

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Porém, o grande diferencial da narrativa neste livro é que, para conhecer o seu lugar no mundo, o personagem principal viaja pelo tempo e espaço conhecendo grandes e importantes nomes da arte, física e engenharia. Passando por grupos tribais da era paleolítica, rainhas do Egito Antigo, renomados pintores da era renascentista, como Da Vinci, entre outros. A narrativa leva o leitor por uma envolvente viagem pelas grandes representações do corpo humano ao longo dos séculos.

“O vaidoso Picasso falou com um tom de voz que revelava contrariedade. Afinal, quem era Mear para se recusar a posar para o famoso artista e para despertar em Dora tanto interesse?”

Mear é o ciborgue que busca conhecer seu propósito no mundo. Até onde ele sabe, sua existência aconteceu de forma inesperada. Seus criadores já o estavam planejando há tempos, porém, de um dia para o outro ele se tornou possível. Criou vida. E dado este importante evento, ele “trabalha” como peça de exposição em um museu, em Berlim.

Com o desejo de se tornar independente, e encorajado pela sua amiga O., ele explorará o próprio corpo, descobrindo suas funções de teletransporte e auto transformação, aprendendo emoções e conhecendo ilustres artistas. Com esses artistas, Mear busca não somente entender mais sobre o seu corpo, mas também, sobre o que é ser um humano. O que define alguém ou algo como um ser humano? São suas atitudes? Seu corpo? Sua fisiologia? Mear desperta no leitor estas e inúmeras outras perguntas.

A narrativa não tem uma linha mocinho-vilão. E não precisa, pois o foco da história é o autoconhecimento. É o de conhecer o corpo em que se habita. E cada vez que Mear busca as respostas para suas perguntas, cada vez mais ele vai se tornando, digamos, humano, o que vai despertando certos sentimentos nele. Poderia um robô como ele se apaixonar por uma humana? A cada pergunta, Mear vai aprofundando sua busca pela própria identidade e, muitas vezes, tem dúvida do que ele próprio representa.

Como citei no começo, é um livro que transcende os gêneros, então, não achei estranho conter na narrativa alguns detalhes que, em teoria, seriam inadmissíveis, como por exemplo, acesso à internet, mesmo estando nos anos 1700, ou conversar com esculturas feitas a mais de 3000 anos antes de Cristo. Mas esse não é um livro para fazer sentido lógico; é um livro pra fazer sentido moral e filosófico.

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Gostei da história apresentada pela autora e pela abordagem diferenciada que ela escolheu para falar um pouco sobre arte e cultura. Outra coisa que gostei muito nesse livro, além da sua excelente e linda edição (a capa está uma perfeição), são algumas ilustrações que são apresentadas dentro do livro, praticamente para cada capítulo. São ilustrações interessante e, se eu não estiver enganado, me parece ser uma representação de como Mear enxergava e compreendia as obras artísticas que visitava.

Mesmo a história tendo me agradado e conquistado em cada capítulo, só não dei cinco estrelas pelo seguinte motivo: o começo do livro é confuso, pois apresenta três prólogos distintos, que ao meu ver se parecem com o passado, o presente e o futuro de Mear, mas de uma forma que não ficou bem claro o propósito. E também que, quando o livro termina, senti que faltou algo na história, além é claro que o mistério principal da história toda sobre o Mear não é revelada.

Mesmo com algumas pequenas falhas, fiquei muito contente em ler esse livro nacional e gostar da história tão bem construída e diferente do que eu esperava. Espero ler mais livros da autora e que ela continue trazendo tramas interessantes com perspectivas de narração diversificadas. É sem dúvida um livro que eu indico para quem gosta de narrativas que induzem a formar questionamentos, a debater sobre o tema, e principalmente, a pensar além do que os gêneros propõem.

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CORPO ESTRANHO

Autor: M. T. S. Dörrenberg

Editora: Empíreo

Ano de publicação: 2016

Corpo Estranho, de M. T. S. Dörrenberg, conta a história de Mear, um ciborgue construído para atuar numa exposição em Berlim. Ao conhecer uma mulher chamada O., Mear sai em uma jornada pelo tempo e espaço em busca de respostas sobre a composição do corpo. Ele pode se transformar na figura que quiser, viajar no tempo e entender qualquer forma de comunicação. Essas habilidades têm por finalidade permitir que o ciborgue se desenvolva no mundo humano, iniciando uma geração de novos seres.

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