Jennifer Lawrence é uma bailarina que quebra a perna e não pode mais dançar. O tio dela é um agente do governo que lida com espionagem. Joel Edgerton é um desses espiões, americano, infiltrado na Rússia. A partir daí, um monte de coisa acontece.
Ao prometer ser uma atualização da fórmula clássica dos thrillers de espionagem dos anos 50 e 60 (que originaram James Bond e Jason Bourne), Red Sparrow abocanha mais do que consegue engolir, na minha opinião.
Adaptado do livro que foi lançado originalmente no Brasil como Roleta Russa de Jason Matthews, o filme é dirigido por Francis Lawrence (que mostrou talento nos últimos três Hunger Games) e sua visão está impressa em cada frame do filme, construindo elegância, firmeza e tensão em todas as cenas. O elenco que o acompanha também cumpre sua tarefa: Jennifer Lawrence já aprendeu a não falhar, os coadjuvantes Matthias Schoenaerts e Charlotte Rampling roubam a cena sempre que aparecem e Mary Louise Parker traz humor quando achávamos que seria um filme 100% sério. Em contrapartida Joel Edgerton fica oprimido por uma narrativa que não o dá muitas camadas, impedindo-o de mostrar seu conhecido potencial; o mesmo acontece com Jeremy Irons. (Ironicamente, estes dois têm papeis muito importantes na trama, mas brilham menos do que outros personagens supérfluos.)
Por a história ser baseada em um livro escrito por um ex-agente da CIA, a carga de realismo é esperada – e, no entanto, tudo acaba soando meio forçado. A protagonista é Dominika, codinome Red Sparrow, cuja história de origem é contada ao longo do primeiro ato do filme; uma bailarina acidentada, Dominika é procurada pelo seu tio (o igualmente sedutor Matthias Schoenaerts), representante do Serviço de Inteligência Russo, para uma missão. Por que? Ela é sexy. Depois de sermos presenteados com cenas de sedução e diálogos afiados, para nos sentirmos de fato em um filme de espiões, somos estapeados com uma cena de estupro desnecessária – tudo para construir uma Dominika assustada, que aceita (à alternativa: morrer) ser treinada pelos russos.
A primeira metade do filme, que trata dos traumas da protagonista como bailarina e de seu treinamento em espionagem e sedução (orientado por uma cruel Charlotte Rampling), faz questão de incentivar e problematizar simultaneamente o uso da sexualidade como arma. Somos apresentados a cadetes russos que são ensinados a usar seus corpos como iscas em suas missões. Em certo momento, a própria Dominika se refere ao centro de treinamento como “whore training”, equiparando o serviço de espionagem a prostituição – não apenas figurativamente. Depois de mais uma cena de estupro (pra quê, gente?), ela deixa esta academia para sua primeira missão. E aqui, parece que encerra-se um filme e começa outro.
Na tentativa de não apenas contar uma história de origem, mas também entregar um autêntico thriller de espionagem, os Lawrences criam e solucionam mais mistérios do que necessário, adicionando personagens supérfluos, finais falsos e mais dúvidas nas nossas mentes. Menos engraçado do que Sr e Sra Smith ou Kingsman, menos profundo do que O Espião Que Sabia Demais ou Ponte de Espiões, menos instigante do que Missão Impossível ou a trilogia Bourne; Red Sparrow é tudo isso, mas não o suficiente.
Nessa segunda parte a CIA torna-se mais ativa; com o encontro entre Dominika e o personagem de Joel Edgerton, a trama torna-se sobre uma espiã que deseja trair seu país. Ou não. Ou sim. O romance que floresce entre os dois parece real, mas pode não ser, mas talvez seja. Essa segunda parte do filme é tentadoramente envolvente – devido aos êxitos de direção, som, fotografia, etc -, mas a narrativa planta dúvida o suficiente para não nos importarmos com os personagem (ou suas mortes) e não nos surpreendermos com grandes revelações. Além disso, algumas cenas sensuais e atrevidas são adicionadas, para acionar o fator “sexy” na descrição do filme; algumas delas, infelizmente, acabam por apenas objetificar Lawrence, inclusive na cena de sexo entre ela e Edgerton, que aparenta desconfortável, corrida e completamente esquisita.
No fim, apesar de todos os esforços da produção – ah! aquela trilha sonora! – em retomar os filmes clássicos de espiões, em criticar/enaltecer o aspecto sexual dessas narrativas e em repaginar as fórmulas que vinham dominando-as, Red Sparrow acaba sendo apenas um filme de Supercine. Mesmo com entregas brilhantes como a música de James Newton Howard e a cinematografia de Jo Willems – além dos já aplaudidos resultados de Jennifer Lawrence e Francis Lawrence -, o filme não consegue se tornar o grande sucesso de crítica que almeja, justamente por tentar contar uma história cheia em um filme que deve, também, ser rentável.
Talvez fosse melhor contar a história do treinamento de Dominika através de flashbacks espaçados? Talvez fosse melhor reduzir o número de viagens e trocas de locação? Talvez fosse melhor omitir as cenas da CIA, aumentando as intrigas? Talvez fosse melhor excluir todo o enredo da colega de quarto em Budapeste? Ou talvez tivesse sido melhor fazer uma minissérie de 4 episódios e almejado alguns Emmys.
Mesmo assim, me diverti assistindo Red Sparrow, me lembrou Sr. e Sra. Smith, os filmes de James Bond e até uma pitada da história da Viúva Negra, da Marvel. Dou 3 estrelas e meia sentindo que eu queria, muito mesmo, que fosse melhor.
PS: Nunca pensei que fosse ver Jennifer Lawrence ser espancada de novo depois de Mother!, mas aparentemente eu estava errado.


OPERAÇÃO RED SPARROW
Diretor: Francis Lawrence
Elenco: Jennifer Lawrence, Joel Edgerton, Matthias Schoenaerts e mais
Ano de lançamento: 2018
Outrora talentosa bailarina, Dominika Egorova (Jennifer Lawrence) encontra-se em maus bocados quando é convencida a se tornar uma Sparrow, ou seja, uma sedudora treinada na melhor escola de espionagem russa. Após passar pelo árduo processo de aprendizagem, ela se torna a mais talentosa espiã do país e precisa lidar com o agente da CIA Nathaniel Nash (Joel Edgerton). Os dois, no entanto, acabam desenvolvendo uma paixão proibida que ameaça não só suas vidas, mas também as de outras pessoas.