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Saindo um pouco do eixo norte-americano de quadrinhos, atravessamos o Atlântico para a melhor introdução possível aos quadrinhos europeus: Tintim.

É preciso destacar que existem algumas diferenças cruciais na estrutura e narrativa nessa mudança de oceanos, sim. Então é importante destacar que há um baque inicial para assimilar, em partes uma verborragia, em partes um tom diferenciado (mesmo material que tende à violência como as expedições de Corto Maltese de Hugo Pratt, essa violência raramente é gráfica ou exposta – é mais conseqüência). Mas principalmente a diferença entre os quadrinhos europeus e americanos reside na estrutura.

Seja um trabalho de Moebius, Hergé ou Albert Uderzo, os autores trabalham cada fascículo como uma história única e fechada, ainda que não necessariamente contida, pois muitas vezes os fatos acabam reverberando em volumes seguintes. Ainda que como no mercado americano os ciclos de vida dos personagens não se restrinja a uma condição narrativa lógica de ‘começo/meio/fim’, e, de mesma maneira um personagem migrar de um autor para outro (menos comum, mas acontece), a forma da produção de conteúdo é bastante diferente, mais próxima da produção literária, com volumes esporádicos, lançados sem uma métrica de produção mensal (como ocorre com os comics americanos).

Narrando as aventuras do jovem (porém nada novato) jornalista que dá título a série, as histórias do belga Hergé traz sempre o jovem diante de fascinantes investigações jornalísticas em busca de desfraldar mistérios ancestrais, redes de corrupção e crime e até explorar a lua (sério). Sempre com um otimismo juvenil e uma determinação irrefreável, Tintim não conhece limites para suas investigações – além do fim da história.

E eu sei que alguns de vocês devem estar com uma pulguinha atrás da orelha esperando que eu comente do elefante branco na sala que é a situação toda envolvendo o racismo na obra de Hergé (que é um caso bastante semelhante ao de Monteiro Lobato e outros autores contemporâneos da primeira metade do século XX) ao que eu realmente tenho dificuldade para abordar porque eu não acho exatamente um tema que mereça debate. Isso é um retrato do tempo e período em que essa obra foi publicada (Hergé lança seu primeiro volume de Tintim em 1929 – Lobato lança ‘Reinações de Narizinho’ em 1931).

Apagar o passado ou fingir que não aconteceu (como os Flintstones e Tom e Jerry vendendo cigarros para crianças na década de 50-60) não resolve em nada, e, inclusive tentar censurar esses trabalhos, na minha opinião faz o efeito contrário do desejado que é o de concentrar em pontos focais (nesse caso em Hergé ou Lobato todo o racismo da sociedade dos anos 30) eximindo o restante da sociedade de sua parcela e participação no problema.

Droga, a Disney apoiou o Nazismo na década de 40! Entender porque essas coisas aconteceram é mais importante que apagá-las da memória! Vale a pena ler ‘Para Ler o Pato Donald: Comunicação em Massa e Colonialismo‘ do pesquisador Ariel Dorfman de 1976, que explica os problemas destas e outras situações.

Voltando a resenha, O Segredo do Licorne não é o começo das aventuras do personagem – é o décimo primeiro dos 24 álbuns lançados – mas é um ponto de partida tão bom quanto qualquer outro, afinal traz uma das mais icônicas histórias do personagem, com boa parte dos tradicionais/carismáticos coadjuvantes da série (O mau humorado Capitão Hadock, os atrapalhados irmãos gêmeos detetives Dupond e Dupont e claro, o cãozinho Milu). A história continua no volume seguinte ‘O Tesouro de Rackam, o Terrível’, que traz também o igualmente brilhante e excêntrico professor Trifólio Girassol.

A história começa quando o jornalista Tintim em um mercado de pulgas compra uma bela réplica de um navio antigo e acaba envolvido numa incrível conspiração sobre tesouros piratas perdidos.

Os dois volumes foram publicados no Brasil em uma única edição pela Companhia das Letras em 2011, com um belo acabamento e capa dura, ao que só acho uma pena que a editora não continue a empreitada.

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