Piranesi, escrito por Susanna Clarke, é um livro de realismo mágico com mistério, de volume único, lançado no Brasil em 2021 pela editora Morro Branco

Foto de capa do livro Piranesi

Sobre o livro

Narrado em primeira pessoa, acompanhamos a história do ponto de vista de Piranesi, um homem de aproximadamente 35 anos, que vive numa Casa que é todo o seu mundo. Ele mantém diários, registrando de maneira minuciosa tudo o que está e acontece ao seu redor: as estátuas que compõem a casa, o ritmo das marés que invadem alguns cômodos, o labirinto de salões que parecem ser de uma grandeza infinita, além de qualquer sinal de natureza que possa chegar até ele.

“A Beleza da Casa é imensurável; sua Bondade, infinita.”

Todas as terças e sextas-feiras, Piranesi encontra um homem que ele chama de Outro, que aparentemente é o único ser humano vivo além dele. As reuniões nunca duram mais de uma hora, Piranesi fala sobre suas  pesquisas e explorações e o Outro o incentiva a continuar seus estudos em busca do conhecimento. Ao contrário dos trapos com que se veste Piranesi, o Outro mantém uma boa aparência e possui muito mais coisas. 

Existem sinais (ossos) de outras treze pessoas que viveram ali, mas não se sabe o que aconteceu com elas. Até que um dia, Piranesi encontra mensagens rabiscadas a giz espalhadas pela casa e ao que tudo indica, não é o Outro e sim, alguém novo na casa, a quem ele passa a chamar de 16 (sendo esse o décimo sexto habitante da casa, uma vez que atribuiu os outros números a ele mesmo, ao Outro, e aos mortos). 

Ao contar isso para o Outro, esse diz que trata-se de uma pessoa perigosa e capaz de manipular seus pensamentos. A partir de então, o protagonista começa a investigar em seus diários relatos que possam ajudá-lo a entender quem é o Outro,  quem é 16 e quem é ele próprio. 


Minha opinião

Desde o início, percebemos a admiração da autora pelo desconhecido e por mundos alternativos, uma vez que Piranesi começa com uma citação de de CS Lewis de “O Sobrinho do Mago” (As Crônicas de Nárnia). Sua habilidade se estende além do mero suspense, mas a história se baseia no aumento constante de apreensão que finalmente dá lugar a uma revelação que muda bastante a perspectiva da trama. 

Ilustração do livro Piranesi

O mistério de Piranesi se desenrola em um ritmo tentador, mas leve. Este cruzamento de reinos – o mágico e o científico – é uma combinação atraente e nos faz levantar inúmeras questões a respeito da história:  quem é Piranesi? Quem é o Outro e o que ele sabe que Piranesi não sabe? Por que eles têm essa relação tão distante, se vendo por tão pouco tempo,  sendo até então os únicos habitantes daquele mundo? Como Piranesi foi capaz de sobreviver durante todo esse tempo? E por boa parte da história, nós não sabemos.

“Talvez até mesmo as pessoas de quem se gosta e a quem se admira muito possam fazer você enxergar o mundo de maneiras que preferia não ver.”

Piranesi é, de certa forma, um sobrevivente: ele sabe se virar, conseguir comida, recolher a água da chuva para beber, mas como leitores, nos perguntamos a todo tempo, intrigados,  como ele foi parar ali. A ideia de qualquer mundo além do mundo da Casa não faz sentido para Piranesi, em parte porque ele acredita que a Casa é suficiente para suas necessidades. Piranesi está terrivelmente sozinho, mas ele faz dessa solidão um presente. 

Foi uma leitura complicada a princípio pois eu fiquei muito tempo perdida e sem entender nada. Em um determinado momento, Piranesi começa a investigar seus diários e muitos outros personagens são introduzidos por meio de suas anotações e descobertas. Entretanto, quando todo o mistério foi revelado (ainda que é possível mais de uma interpretação ) é que percebi a criatividade da autora ao escrever essa história. Foi algo que me fez fechar o livro e querer relê-lo sob essa nova perspectiva. 

Por um instante, tive noção de como seria o Mundo se, em vez de duas pessoas, houvesse milhares.

Esse livro me fez pensar  sobre a quantidade de palavras que perdem o significado em um mundo em que não existe sociedade, onde existe somente um “eu” , solitário e o Outro, que de nada sabemos. Piranesi tem conhecimento de algumas palavras comuns no nosso mundo, como, por exemplo,  “universidade”,  mas muitas vezes ele não sabe o significado delas e acaba inferindo sobre essas coisas que, para ele, são só ideias de um mundo desconhecido. 

Detalhe do livro Piranesi

Piranesi é uma leitura que pode ser vista como um estudo da solidão.  Também pode ser interpretado como um estudo da mente humana e do impacto do trauma. Seu narrador, embora privado de companhia e memórias confiáveis, parece curiosamente satisfeito com tudo o que tem. Esses momentos são tocantes, refletem a pureza e a essência de Piranesi, mas sua aceitação tão peculiar chegam a ser inquietantes.

Em momentos como quando ele se agarra à estátua durante uma enchente não como uma âncora, mas como se a mesma fosse um ser vivo que pudesse salvá-lo , a doçura, a inocência do olhar de Piranesi, o amor por este mundo é devastador de se ler. Nessas interações breves, mas dolorosamente ternas, somos abatidos pela solidão que Piranesi não consegue compreender totalmente

Se você gosta de livros de realismo mágico com toque de mistério, como é o caso de O Mar Sem Estrelas, e de histórias que brincam com a imaginação do leitor, como Caraval, Piranesi é uma excelente escolha!

PIRANESI

Autor: Susanna Clarke

Tradução: Heci Regina Candiani

Editora: Morro Branco

Ano de publicação: 2021

Em uma realidade onírica, magia e razão estão intrinsicamente ligadas nesta obra que se entranha por tênues labirintos místicos e extraordinários. Piranesi vive na Casa. Talvez, sempre tenha vivido. Em seus diários, dia após dia, ele registra de maneira clara e cuidadosa todas as maravilhas que encontra: o labirinto de salões, as milhares de estátuas, as marés que invadem as escadarias, as nuvens que se movem em uma procissão lenta pelos cômodos de cima. Habitualmente, encontra-se com o Outro, sua única companhia e com quem divide as pesquisas e explorações. Às vezes, Piranesi também leva oferendas aos mortos, mas, na maior parte do tempo, está só. De repente, mensagens começam a surgir no chão, rabiscadas a giz. Há alguém novo na Casa. Mas quem é essa pessoa e o que ela quer? É amigável ou traz consigo destruição e loucura, como diz o Outro? Textos perdidos têm de ser encontrados. Segredos esquecidos precisam ser revelados. O mundo que Piranesi pensava conhecer está se tornando obscuro e perigoso.

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