Sou da teoria de que um filme em preto e branco sempre chama a atenção. Por isso, me bastou isso e um contexto histórico para ficar curiosa com o longa parcialmente biográfico escrito e dirigido por Kenneth Branagh. A produção de Celia Duval, Tamar Thomas, além do próprio Branagh, contou ainda com a fotografia de Haris Zambarloukos e figurino de Charlotte Walter.

A história, inspirada na infância do diretor, tem como protagonista Buddy (Jude Hill), de 9 anos, que vive com sua família em um bairro muito unido, ainda que empobrecido, em Belfast (Irlanda do Norte) durante a década de 60. A vida pacata do garoto é abalada pelas dificuldades financeiras dos pais e pelos conflitos que se espalham pelo país entre católicos e protestantes.

A sinopse não diz muito ao espectador, e se a premissa já é bastante simples, também o é o enredo. Como dizer “nada demais acontece”, mas no melhor sentido possível? Como dizer que esse filme é somente sobre Buddy e sua família, mas também sobre muito mais?

Acompanhamos Buddy em pequenos episódios que representam muito. Suas travessuras com a prima, sua vontade de fazer o certo, diálogos profundos mas extremamente simples no vocabulário de crianças. Sua relação com o pai, que trabalha em outro país, com a mãe, que o educa, com os avós, que o amam. É tudo muito doce e tocante de assistir, e nisso atua o preto e branco do filme, trazendo uma nostalgia intrínseca à história, bem como compondo a simplicidade que o longa pretende transmitir. Tudo aos olhos da criança é em preto e branco, e as zonas cinzas a confundem.

Eu não conheço nada além de Belfast.

Trilha sonora e atuação são dois dos elementos naturais que compõem essa história absolutamente universal. Sinto que não poderia criticar a forma como atores trazem à vida personagens que extrapolam o conceito de história; eles são literalmente nomeados “Ma” (mamãe) “Pap” (papai), poucos têm nome. Eles são quem são, e quem assiste se convence completamente disso. A parte que merece todos os holofotes, entretanto, é a relação belíssima entre Buddy e seu avô (Ciarán Hinds), linda de assistir.

Portanto, nada acontece, e ao mesmo tempo tudo acontece. Há comentários sociais, sobre desemprego, casamento e, obviamente, sobre o conflito religioso, mas tudo isso influencia como um pano de fundo nas temáticas de infância, lar, amor e inocência, assim como a perda de tudo isso. Inclusive, como uma indicação dupla, acho que quem se envolver com a atmosfera do filme também iria se emocionar muito com “Campo Geral”, de Guimarães Rosa. O livro é curto e aborda os mesmos temas, além de ter a linguagem única que se tornou marca registrada do autor.

A única ressalva que consigo pensar em fazer é que o irmão de Buddy não tem qualquer papel na trama, e sinto que ele precisaria ter ao menos uma relação bem desenvolvida com Buddy. Talvez isso tenha a ver com a vida de Branagh, que pode ter tido de fato uma amizade mais próxima com a prima do que com o irmão. Ou talvez essa seja eu buscando desculpas para um filme que me emocionou demais.

Belfast é lindo, fofo, sensível, e imensamente triste e feliz ao mesmo tempo. Vários pequenos momentos ficaram marcados em mim, principalmente o final, o qual não teria, nem se quisesse, palavras para descrever. Assistir Buddy é como ser abraçada por alguém que já partiu.

BELFAST

Diretor: Kenneth Branagh

Elenco: Jude Hill, Ciarán Hinds, Judi Dench, Caitriona Balfe, Jamie Dornan

Ano de lançamento: 2021

Na Irlanda do Norte dos anos 60, um menino de 9 anos experimenta o amor, a alegria e a perda. Em meio a conflitos políticos e sociais, o garoto tenta encontrar um lugar seguro para sonhar enquanto sua família busca uma vida melhor.

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