Mundo Novo é o primeiro livro da trilogia The Young World, escrita pelo autor e roteirista Chris Weitz. Foi lançado em 2014 pela editora Seguinte.

SOBRE O LIVRO

Há dois anos o planeta foi devastado por um mortal e desconhecido vírus. Todo mundo morreu, adultos, crianças, homens e mulheres. Mas, por algum motivo, os adolescentes sobreviveram. Ninguém faz ideia do porquê, mas sabem que os dias também estão contados, pois todos se tornam estéreis. Assim, os sobreviventes deste apocalipse se reúnem em bandos pequenos, cada um com seu estilo, gosto, crença e organização. Um desses bandos é o Washington Square, no centro de Nova York.

Liderando o grupo está Jefferson, que se sente inseguro e teme não conseguir manter a ordem e a paz, coisas que seu irmão Washington fazia muito bem, antes de ser morto pelo vírus, poucos dias depois de completar 18 anos. Em meio ao caos, Jefferson busca uma forma de manter a tribo à salvo de qualquer ameaça, ao mesmo tempo que precisa encontrar uma forma alternativa de manter todos alimentados e protegidos. Até que Crânio, um garoto quieto e com jeito nerd descobre uma pista do que pode ter sido responsável pelo vírus e, quem sabe, até mesmo uma cura.

“As pessoas gostam de dizer coisas como “Um tiro ressoou”, mas não há nada de melódico num tiro. É algo percussivo. POW! Anula todos os sentidos por um momento, e seu instinto é fechar bem os olhos e tentar encontrar o buraco mais próximo para se esconder.”

Porém, para achar as informações que precisam para entender melhor como o apocalipse começou, Jefferson reúne um pequeno grupo para se aventurarem além dos limites conhecidos da tribo. Junto com ele está Peter, Donna e Crânio. A missão é chegar a uma biblioteca que fica alguns quarteirões distantes e de preferência vivos. O caminho até lá é rodeado por outras gangues, bandos rivais, saqueadores, e até mesmo animais ferozes que fugiram do zoológico. Em meio a perdas e conquistas, o grupo precisará lidar com as novas informações que vão descobrindo sobre o apocalipse, além de encarar um novo mundo, onde o caos e a desordem reinam e onde nenhum lugar é seguro para se estar.


MINHA OPINIÃO

Algumas vezes já me perguntei o que aconteceria se a humanidade fosse dizimada por alguma catástrofe biológica e poucas pessoas sobrevivessem. Bom, Mundo Novo tenta mostrar como poderia ser isso, mas no caso, se restassem só adolescentes. E devo dizer que não é algo muito “bonito” de se imaginar. Jovens vivendo em um mundo sem leis, regras ou qualquer força maior que diga o que é certo e o que é errado, lutando dia após dia para se manterem vivos, e pior, hormônios à flor da pele… já dá pra ter uma noção de como seria, não é?

A premissa do livro é interessante e já fazia algum tempo que eu queria lê-lo. Trabalhando temas críticos e polêmicos, como sexualidade, preconceito, machismo e deficiência tecnológica, Chris Weitz buscou uma forma de tornar o leitor mais consciente e crítico de sua própria realidade. É uma forma bem sutil de dizer “olha, tudo isso que você tem hoje, redes sociais, celular, gadgets, etc etc, um dia pode ser inútil e não vai te ajudar a sobreviver”. E prova disso é que em toda a trama há referências a tecnologias e objetos de consumo atual, sem mencionar que diversas vezes os personagens dizem o quanto o mundo de Antes era, em sua essência, sufocante, arrogante e depreciativo.

“Presas com fita adesiva ao pedestal, lembranças dos mortos. Fotos de mães, pais, irmãos e irmãs, animais de estimação perdidos. Aquilo que sua mãe costumava chamar de “fotos de verdade”, ao contrário dos arquivos digitais. Sobraram as cópias impressas, agora que milhões e milhões de recordações se perderam na nuvem. Um oceano de uns e zeros significando nada.”

A trama é narrada por Jefferson e Donna, intercalando os capítulos. Jefferson é o atual líder da tribo da Washington Square. Ele era irmão de Wash, e desde que a doença o levou precisa manter  grupo unido. Mas ele não se sente tão seguro da tarefa, pois sempre viveu à sombra do irmão. Ainda que ele seja um garoto honesto e confiante de seus propósitos, não tem a mesma habilidade em comandar pessoas. Interessante notar que o personagem lida com vários conflitos internos e externos, característicos da adolescência. A questão da aceitação social ou de ser destaque no meio dos outros figuram a narrativa por grande parte.

Por outro lado, temos Donna. Ela tem uma personalidade bem distinta e isso é evidente não só pela forma como ela narra o livro, mas também pela forma como enxerga o futuro. Enquanto Jefferson quer encontrar uma forma de salvar a humanidade, para Donna tanto faz, está tudo perdido, então só importa viver um dia de cada vez, até o fim. Ela tem um ar de segurança e liderança mais característico do que Jefferson, mas por dentro seu peito é atormentado por dor, sofrimento e raiva. Ela não quer parecer fraca em nenhum momento, principalmente diante dos garotos, mas às escondidas, não consegue negar a sua decepção com a forma que sua vida terminará.

A disparidade entre os dois protagonistas reforça a minha ideia de que a tribo deles representa um tipo de utopia social. Um grupo onde homens e mulheres, homossexuais e heterossexuais, negros e brancos, todos tem voz. Ninguém é superior a ninguém, e qualquer um que tenha uma boa ideia de manter a sobrevivência é bem vindo ao grupo. Quem dera no mundo real fosse possível a sociedade aceitar as diferenças um dos outros e viver em harmonia. Mas veja bem, se por um lado esse grupo representa a sociedade ideal, por outro lado há grupos para representar a oposição: tribos machistas, racistas, territorialistas, opressoras, entre outras. Todos estão ali vivendo em um mesmo mundo destruído, cada um lutando por seu espaço. Acredito eu que isso faça uma grande analogia à nossa realidade, onde há diversos “grupos” lutando por seus interesses, em constante confronto ideológico.

“Eu pensava que Ele talvez tivesse se esquecido de nós. Perdido a humanidade no bolso. Mas agora sinto como se tivesse nos jogado fora. O mais longe que conseguiu.”

A problemática do livro se dá exatamente neste contexto: quando o pequeno grupo da Washington Square precisa sair de sua zona de conforto para buscar alternativas, vão encontrar vários obstáculos, e o que melhor para representar isso do que confrontos com tribos diferentes e perigosas? E porque usar adolescentes para tratar desse tema? Simples, eu diria. Os jovens representam as “armas” ideias para mudar a sociedade atual. Com eles pode-se ter a esperança de quebrar tabus, romper paradigmas e aos poucos, atingirmos mais um degrau de nossa constante evolução.

Nesse ponto eu gostei bastante do livro, pois ele possui uma temática muito próxima a da distopia, ainda que aqui não seja o caso. Enquanto a distopia apresenta uma problema dentro de uma sociedade organizada após um apocalipse, aqui mal temos a noção do que é sociedade. Há tribos, mas está mais para agrupamento de refugiados do que sociedade em si. Mas a trama não está longe de se tornar uma distopia, basta o autor querer mudar o foco da narrativa.

Entretanto, eu tive vários problemas com essa história. O background é bonito e interessante, mas o autor não aprofunda ela. As críticas sociais estão presentes, as metáforas estão ali, mas só são jogadas no ar e acaba por aí. A trama não vai além, não explora os conceitos, e fiquei bem chateado nesse ponto. Havia muito potencial, mas o autor passou por cima. O mesmo acontece com os personagens. Ainda que tenham personalidades distintas, elas não são aprofundadas, não são evoluídas. Mal conhecemos o passado de cada um, não há mudanças drásticas que tornem o personagem melhor. É como se o autor subestimasse a inteligência do leitor e tivesse medo de propor mais densidade à trama.

“O engraçado é que as pessoas pensavam que os livros eram tão inúteis, tipo, que o Kindle e tudo mais iam acabar com eles. E, agora que penso nisso, a ideia de acabar com os supostos livros antiquados de merda é meio babaca.”

Há outra questão também que são as contradições. O livro fala bastante sobre a liberdade e o repúdio ao preconceito e as antigas regras, mas em vários momentos há falas onde há preconceito racial ou sexista presente, bem como personagens que negavam essas atitudes, mas fazendo ou falando coisas com esse tom. Em dado momento do livro, notei inclusive que os personagens estavam um pouco estereotipados: o herói que não quer ser herói, o nerd que sabe tudo, o garoto malvadão que toca o terror, a garota com corpo sexualmente atraente, a oriental que domina uma arte marcial. Se a trama faz críticas a esses conceitos, qual o sentido de ter personagens que se caracterizam neles?!?

Outra questão que preciso falar é em relação a edição. A diagramação está muito boa, folhas amarelinhas e com fontes bem dinâmicas e atrativas. A leitura é super fluida e dá pra ler o livro todo em um único dia, se você tiver tempo. Ficou bem caprichado. Mas, a capa é algo que não consigo gostar. A ilustração é bonita, sim, mas não curti tanto assim. Não sei por qual razão a editora resolveu mudar da original para essa, mas eu realmente achei a mudança desnecessária. Talvez tenha sido alguma questão de marketing, público-alvo, quem sabe.

Capas originais da trilogia

Mesmo diante dos poréns, fiquei curioso para saber o que virá no segundo. O final foi bem atropelado e até mesmo óbvio, mas nas últimas linhas há uma revelação que eu não esperava e que tem força para mudar tudo o que esse primeiro livro mostrou. Cabe agora ao autor ter trabalhado melhor a história e aprofundado ela. Pelo que já andei vendo em outras resenhas, é mais ou menos isso que acontece, então vou dar um voto de confiança.

MUNDO NOVO

Autor: Chris Weitz

Editora: Seguinte

Ano de publicação: 2014

Depois que um misterioso vírus erradicou toda a população exceto os adolescentes, os jovens dividem-se em tribos para sobreviver. Jefferson, o inseguro líder da tribo da Washington Square, e Donna, a garota por quem ele está secretamente apaixonado, se estabelecem precariamente em meio ao caos. Porém, quando outro integrante do bando descobre uma pista que pode levar à cura da doença, eles partem em uma viagem arriscada para salvar o que restou da humanidade.
Alternando entre os pontos de vista de Jeff e Donna, descobrimos uma Nova York muito diferente: os animais do zoológico do Central Park agora vivem soltos na região, a Grand Central Station virou um enorme mercado… e há tribos inimigas por toda a parte. Enquanto enfrentam todos esses perigos, Jeff tenta criar coragem para se declarar, e Donna luta para entender seus próprios sentimentos — afinal, conforme os dias passam, a adolescência vai ficando para trás e a Doença está cada vez mais próxima.

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